Repórteres detalham desafios em entrevista com mãe de menina sequestrada em Tramandaí

Ian Tambara foi o primeiro repórter a chegar no local e conversar com ela, que foi ouvida também por Matheus Valêncio, Renato Dias e Jean Peixoto

Jean Peixoto, Matheus Valêncio, Ian Tambara e Renato Dias (da esquerda pra direita) - Crédito: Arquivo pessoal

Trabalhar em uma redação leva jornalistas a percorrerem diferentes caminhos, mas alguns casos ficam marcados pela gravidade e repercussão social. Foi o que aconteceu com Ian Tambara, jornalista da Rádio Gaúcha, ao reportar o sequestro e abuso de uma criança de nove anos em Tramandaí. Na semana ada, ele foi o primeiro a entrevistar a mãe da menina, que foi vítima do sequestro, após a criança ser resgatada pela polícia. Diante de tamanha repercussão, a equipe de Coletiva.net conversou com os quatro jornalistas que participaram desta cobertura:  além de Ian, estiveram Jean Peixoto, de GZH; Matheus Valêncio, do SBT; e Renato Dias; repórter do Correio de Imbé, que foi procurado pela família quando a vítima desapareceu. 

Ian contou que faltavam apenas 30 minutos para entrar ao vivo e ainda não tinha nenhuma novidade sobre o caso na manhã da última quinta-feira, 27, quando descobriu uma referência de onde podia ser a casa da família da vítima. "Assim que abordei um morador do bairro, ele contou que era vizinho de pátio da mãe da menina. Mas disse que a família não estava dando entrevista, mas quando ela (a mãe) nos viu, ela quis falar, pois queria dar a versão dela. E foi um nó no estômago ouvir esse relato", explicou o repórter. 

Desde que recebeu a informação, ainda na redação, Tambara percebeu que esse caso era diferente. "Não era nada perto de um contexto que já tínhamos visto. Era uma cena de filme de terror. A população estava revoltada, e isso indicava que a cobertura exigiria atenção redobrada", relatou. A agilidade no deslocamento foi essencial para a cobertura do caso. Cerca de uma hora e meia depois que recebeu a notícia do desaparecimento da menina, ele já estava no local, apurando as informações. 

Correio de Imbé

O primeiro jornalista a receber um telefonema da família foi Renato Dias, do Correio de Imbé. Por ser da imprensa local, eles o procuraram quando constataram que a menina não havia voltado pra casa. "Fiz uma live com eles para sensibilizar a população sobre o desaparecimento da menina". Pai de duas crianças, ele itiu que foi muito difícil acompanhar de perto a angústia da família. "Saí da Delegacia, na primeira noite, às 2h30 da madrugada. E todos temiam o pior", revelou. 

Renato acompanhou do início ao fim o sequestro da garota. São deles as imagens que correram portais regionais e nacionais do resgate da criança. "Foram mais de dois milhões de visualizações na nossa live. A população estava muito revoltada e não foi possível conter a fúria das pessoas. A situação só acalmou depois da chegada do Batalhão de Choque", explicou Renato, que sofreu com o efeito do gás lacrimogêneo utilizado pelos policiais. O repórter contou ainda que decidiu não entrevistar a família depois que ela foi localizada: "Acho que a família já estava muito exposta, tinham pessoas indo na casa deles para saber detalhes do que aconteceu. Preferi não conversar com eles", concluiu. 

SBT 

Único repórter de TV que conversou com a mãe da criança, Matheus Valêncio, contou ao Coletiva.net que a cobertura foi tensa e impactante. "Casos como estes sempre causam uma espécie de dilema em algum momento: conseguir separar o profissional do ser humano durante o exercício da reportagem. Fomos embora exaustos, mas saímos de lá com a sensação de dever cumprido, já que conseguimos detalhar o ocorrido e chegar a todas as fontes relevantes do caso. Um trabalho que só é possível graças ao comprometimento de toda equipe, como sempre precisa ser no decorrer do processo televisivo", explicou. 

GZH e Zero Hora

O jornalista Jean Peixoto também conseguiu conversar com a mãe da menina e extraiu informações que ainda não haviam sido publicadas, como a carência no atendimento psicológico, que é realizado em Porto Alegre, e por esta razão a família precisa se deslocar de Tramandaí para a Capital. Ele revelou também que presenciou o delegado de Polícia pedir para que outro repórter encerrasse a entrevista a fim de poupar a família, que estava muito cansada. "Pautas como essas são um desafio, exige do jornalista cuidado e zelo. Temos que entender onde é o limite entre informar e respeitar o espaço das pessoas vítimas de tamanha violência. Não existe um manual pra isso, existe um cuidado e o que vamos construindo ao longo da nossa carreira", ponderou. 

Ian Tambara faz coro à fala do colega: "casos como esse exigem do jornalista muito mais do que rapidez e apuração. É necessário sensibilidade para lidar com a dor das vítimas, responsabilidade na divulgação das informações e compromisso com a verdade". 

Entenda o caso

Uma menina de nove anos desapareceu após sair para brincar em uma praça em frente à sua casa na terça-feira, 25. Preocupados com a demora, familiares iniciaram buscas, mobilizando vizinhos e utilizando cartazes e um carro de som para divulgar o sumiço. Durante as buscas, o pai da menina foi até uma loja de conveniência onde ela estava mantida refém e desconfiou do comportamento do suspeito, que ouvia música alta e tinha um arranhão no nariz. A Brigada Militar e a Polícia Civil foram acionadas e, com auxílio de câmeras de segurança, identificaram a criança entrando no local. Ao chegarem, ouviram gritos de socorro e encontraram a menina presa em um compartimento escondido no chão. O homem foi morto após ser linchado pela população, que estava revoltada com o caso. 

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