Rive Gauche 63357

Sexta-feira, 19, José Antônio Moraes de Oliveira, em sua coluna aqui em Coletiva, escreveu “Copiando Hemingway”. Sugiro que você leia também. Caríssimo Killer Esta … 55419

22/06/2009 00:00
Sexta-feira, 19, José Antônio Moraes de Oliveira, em sua coluna aqui em Coletiva, escreveu ?Copiando Hemingway?. Sugiro que você leia também. Caríssimo Killer Esta pergunta de seu e-mail me pegou indefeso: ?Caro Mario, quantas vezes não trombamos com Hemingway em uma esquina da Rive Gauche??. Estou certo de sua certeza de mexer comigo. Mexeu. Lembranças foram agitadas. Li do seu almoço em Montparnasse, no Closerie des Lilas, dos primeiros locais em que, entre um gole e outro, na Paris da década de 1920, Hemingway escrevia aquela Paris da ?Geração Perdida?, como batizou Gertrude Stein, uma recriminação pelo imenso consumo de álcool daqueles jovens escritores americanos, depois famosos. Quando, numa viagem, fui apanhar a socióloga Ana Caruso, que ava um ano por lá, a trabalho do então presidente Fernando Henrique, descobri que ela morava no mesmo espaço do segundo endereço de Hemingway, no 113 da Rue Notre-Dame-des-Champs, a 100 metros do Closerie. O prédio, apartamentos em cima de uma serraria, onde viveram Hadley, o escritor, e o pequeno filho deles, Bumby, não existe mais. Surpresos pela coincidência que expliquei para Ana, ela e eu respiramos bem fundo para ver se ainda captávamos algo daquele clima de criatividade e do belo amor e recíproco encantamento do casal. Iria levar Ana ? por conhecer o ado glorioso do Closerie des Lilas ? para jantar lá, mas ela me dissuadiu pelo motivo que você pagou para descobrir: ?a comida não justifica os preços cobrados?. Você bem sabe que, em Paris, não se come e nem se bebe em locais com história sem que a história esteja agregada aos preços praticados. Em Saint Germain, a menos de 200 metros do Café de Flore e do Aux des Magots, bebe-se uma taça de vinho pela metade do preço de quem estiver sentado naquelas cadeiras onde Sartre, Simone de Beauvoir e a turma do existencialismo descansavam a bunda, punham a cabeça a trabalhar e a trocar ideias. O Le Procope fica a apenas duas quadras, quase que esquina do mesmo Boulevard Saint Germain. Como você sabe, foi na efervescência da Paris do século XVII, em 1686, que, na Rue (atual) Ancienne Comédie, surgiu com toda a pompa e luxo o Cafe Procope e, pouco depois, bem em frente, a Comédie Française. Assim como Molière e Racine, eram habitués Voltaire, Jean-Jacques Rousseau, Diderot e inúmeros outros enciclopedistas, os precursores intelectuais da Revolução. No Le Procope, o lugar-tenente Napoleão deixava pendurado seu chapéu quando ?dependurava? a despesa, e Benjamin Franklin rascunhou a declaração de independência dos Estados Unidos, cuja redação final ? de Jefferson ? foi proclamada em 4 de julho de 1776. Sete anos depois, os ingleses arriaram as calças e foi também Jefferson que, em setembro de 1783, assinou com a Grã-Bretanha o Tratado de Paris, pondo fim à luta da Independência dos Estados Unidos, a primeira colônia, na História, a se livrar do jugo dominante. Por acaso, ao sair certa vez do Musée Quai d'Orsay, subindo em direção ao meu hotel a 50 metros do Le Procope, dei de cara com uma placa dizendo que lá, naquela casa, fora assinado o Tratado de Paris. Uma prova que na Rive Gauche se tromba, além do grande Hemingway, com fatos que a nossa vã informação nem supõe. Quanto ao Le Procope, durante a revolução sa, foi rebatizado de Café Zoppi e tornou-se o ponto de Danton, Hébert, Marat, Desmoulins, que reuniam os seus partidários e pregavam reformas, guilhotina e liberdade. As palavras de ordem para os ataques às Tuileries, que culminaram com a vitória revolucionária, partiram do Le Procope, um enclave histórico da Rive Gauche. Após momentos de luxo, de glória, de falência e de ressurreição, foi adquirido, em 1987, pelo importante grupo Les Frères Blanc, tornou-se uma brasserie e, nas duas vezes onde lá almocei, a qualidade das instalações, do serviço e dos pratos fez jus a todos s francos cobrados. Em 1992, o Café Le Procope foi tombado, pela prefeitura de Paris, como monumento histórico. Naquela noite em que não jantei no Closerie, antes de ir comer um cassoulet (você também gosta daquela feijoada sa com feijão branco e carnes de aves?) num modesto bistrot que descobrira em viagem anterior, tomamos o aperitivo no também famoso La Coupole, que até tem um livro com a mesma abordagem editorial do nosso ?Antonio's?. Eu ia escrever sobre aquele local que, apesar de só inaugurado na década de 1920, é o que mais se parece com o espírito antigo da nossa centenária Confeitaria Colombo. Acontece que comecei a rir comigo mesmo com algumas lembranças do La Coupole, vi o tamanho deste bilhete que nasceu como um breve comentário que iria fazer ao pé da sua crônica, peço desculpas por fazê-lo assim público e, quanto ao La Coupole, fosse eu o saudoso cronista Jacinto de Thormes diria: Depois eu conto. Como sou um simples caipira, fico no Inté.