Se alguém quer mudar sua biblioteca de um apartamento para outro, que não o faça pessoalmente. Não há como resistir à tentação de abrir livros velhos, para descobrir que são livros novos. De cada vez que se lê um livro, nele se descobrem coisas novas que nos tornam novas pessoas, que descobrirão coisas novas e assim até o fim dos tempos. 34675y
Pois foi assim que, esta semana, dei de cara com "Carlota Joaquina na Corte do Brasil", da historiadora carioca Francisca Nogueira de Azevedo. Segundo a autora, o livro foi escrito para salvar a mulher de D. João VI da difamação histórica. Sua tese: a personalidade forte e independente foi o maior obstáculo para que Carlota pudesse vencer em um mundo de homens.
A questão parece estar colocada dentro da chamada guerra dos sexos. Caricaturada com exageros em filme de Carla Camurati e também em uma série de televisão, os registros da época mostram Carlota Joaquina não em guerra com todos os homens, mas com um em particular, seu marido, o rei D. João VI.
Em relação a outros maridos, era bem mais condescendente. O que já não se pode dizer em relação às mulheres desses maridos. Uma delas, Gertrudes Angélica Pedra Carneiro Leão, casada com Fernando Carneiro Leão, amante de Carlota, foi assassinada na saída da igreja. O criminoso fugiu sem ser identificado. A investigação, feita pelo desembargador José Albano Cordeiro, revelou que Carlota Joaquina era a mandante do crime. O escândalo foi abafado.
A guerra de Carlota contra D. João VI está documentada. O objetivo era assumir o trono como regente e devolver Portugal à Espanha. Em 1806, dois anos antes de a família real vir para o Brasil, fugida de Napoleão, ela tentou interditá-lo como louco.
Não conseguiu. A partir daí, sim, o que há são suposições de que ele temia ser envenenado por ela. Para evitar surpresas, D. João ia para a cozinha supervisionar o preparo dos frangos, da matança até saírem do forno. Depois os guardava no lugar mais seguro que conhecia, seus próprios bolsos, de onde os tirava para comer a qualquer hora. Acabou ridicularizado como pateta e glutão.