Brácula é um vampiro enorme e sedento. Tem 507 anos e já teve outros nomes. Através dos tempos, vem sugando os desvalidos que encontra pela frente. E desvalidos não faltam em torno do seu palácio. Desde a era moderna, Brácula acrescentou um novo hábito às suas tradições sugadoras: se tornou um vampiro esportivo - sem ser esportista. Pouco se sabe sobre o instinto sedento de Brácula. Porém, das suas investidas no pescoço das pobres vítimas, um dossiê começa a se formar. Porque, diferente dos vampiros clássicos, Brácula age às claras, em público, até exibicionista é. 1e2u4i As evidências comportamentais mais conhecidas desse monstro, explorador das forças e energias de atletas, são sazonais: ele hiberna por dois anos e se ergue do palácio quando se anunciam, alternadamente, as olimpíadas e os jogos pan-americanos. Aí, sejam onde forem os eventos, Brácula surge garboso nos ares televisivos e nos céus das campanhas publicitárias. Todo flamante em sua capa embandeirada, sobrevoa estádios, quadras, canchas, piscinas. À espreita dos incautos brasileiros vencedores das provas. Pairando no ar, intensifica a sua aura institucional. Magnético em seu poder aproveitado, hipnotiza participantes e platéias. Aguarda que os pódiuns se encham das suas potenciais vítimas. Brácula baba de expectativa. A partir da entrega de medalhas e troféus, em todas as modalidades, Brácula se atira na direção de atletas e jogadores vitoriosos. Crava neles seus pontiagudos caninos oficiais. Da jugular dos campeões, individuais e equipes, retira todo o brilho e glória conquistados por eles. Brácula bebe tudo de todos e assim se exalta. Sua figura cresce e, embora pareça que os flashes e holofotes focam os esportistas, é Brácula quem se destaca nas imagens, nas locuções, nas páginas da mídia. Em pouco tempo de competição, infla de ufanismo e se apossa da estatística dos prêmios. As vítimas, sugadas, ainda estão em cena, têm o ouro, a prata e o bronze pendurados no pescoço mas o valor já não lhes pertence mais. O repugnante dessa chupação de esforços pessoais é que Brácula jamais fez nada para tornar suas futuras vítimas mais fortes, melhor preparadas, não dá a elas um mínimo de condições para competir. Pelo contrário: Brácula tem preferência pelos anêmicos, pelos esquálidos, pelos subnutridos. E sua sede vampiresca recai exatamente sobre os atletas mais solitários e desamparados, os sem-clubes, sem-patrocínio. Apetite maior ainda lhe despertam os da periferia, os corredores de pé no chão, os maratonistas vermifugados, gente que vence por uma sobre-humana determinação pessoal. Gente que treina por conta e risco, que sofre na carne o abandono do esporte amador no país. E na hora em que essas vocações atléticas teriam seu merecido lenitivo, surge Brácula, impávido colosso, e chupa seu vital reconhecimento. O resto é a rotina da rapina. Assim que se encerram as cerimônias, o saciado Brácula volta ao seu berço esplêndido. Esquece as honras que engoliu e vai dormitar por mais um biênio, a ruminar índices e a regurgitar sangue de miseráveis. Enquanto isso, no limbo entre eventos, os sacrificados desaparecem, nomes nas sombras. Vão lamber suas mazelas, treinar sem recursos, superar limites em frias madrugadas, partir pra próxima. Além deles, novos esperançosos sonham com o escape da pobreza nas raias. Todos tentam ignorar a vigília perpétua do sedento Brácula. Alguém tem que acabar com essa vilania oficialesca. Cravar logo uma estaca no peito de Brácula. Bah, tolice ansiar por isso. Pelo que se sabe, Brácula nem tem coração. |
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Brácula 2c5i
Brácula é um vampiro enorme e sedento. Tem 507 anos e já teve outros nomes. Através dos tempos, vem sugando os desvalidos que encontra … 593k4j
20/07/2007 00:00