Recentemente, saiu a notícia de que uma empresa de bebidas alcoólicas da Grã-Bretanha foi proibida de veicular um anúncio onde três mulheres pescavam um jovem (bonitão, é claro). A propaganda foi proibida porque o órgão fiscalizador inglês entendeu que dava a idéia de que a bebida era responsável pelo sucesso. E a notícia complementa ainda que a agência responsável terá que trocar o modelo por outro de meia-idade, acima do peso e careca. b3s65
Algumas leituras são possíveis. Primeiro, de que as companhias de bebidas efetivamente fazem isto, associar seus produtos ao sucesso, simpatia, sexo e alegria.
Segundo, que o mercado de trabalho para os gordinhos carecas pode estar iniciando uma expansão, se esta tendência se confirmar no restante do mundo. Assim, você, amigo careca (ou capilarmente prejudicado, para ser politicamente correto), saiba que "seus problemas acabaram". Você vai poder ser o top model que sempre sonhou.
Só que tenho dúvidas se esta tendência vai se espalhar ou não. As pessoas ficam divididas ao verem lindos homens e lindas mulheres, ricos e bem-sucedidos nas propagandas.
Por um lado, sentem-se longe deste mundo bem-sucedido, feliz e ideal que vêem nos comerciais. Olham para a TV e olham para as suas vidas e se frustram. Não enxergam aquilo tudo nas suas vidas. Até porque, importante ressaltar, ninguém tem a vida perfeita mostrada nas propagandas. Todos temos altos e baixos na vida, momentos de felicidade e infelicidade. Assim, estas pessoas dão a falsa impressão de que uma vida perfeita é possível. Mas certamente não é, porque a vida de todos nós é feita por pessoas e pessoas são falíveis.
Por outro lado (e justamente por não terem aquela vida idealizada), as pessoas querem mais é ver uma vida perfeita, amores perfeitos e finais felizes. A frustração já está nas suas vidas, elas querem mais é o ópio. No Brasil então, onde grande parte da população não tem sequer condições minimamente dignas de vida, as pessoas querem mais é o conto de fadas, o lúdico. Realidade? Não, obrigado, ela é dura demais. Assim, fora gordinhos carecas. Celulite nas mulheres? Nem pensar.
Como explicar, então, o sucesso de personagens feios, baixinhos, carecas ou fracotes? Lembram do Arakem, o show man (foto acima)? Era um anti-herói, mas que fazia enorme sucesso entre as mulheres, ao menos nas propagandas. O próprio Cláudio Moreno, que foi durante muitos anos garoto-propaganda da Bombril, era outro exemplo. Havia grande simpatia pelo personagem dele, embora este fosse magrelo, tímido e meio desajeitado. A explicação é a identificação, a solidariedade.
Identificação em ver alguém que, como nós, tem limitações e enfrenta (teoricamente) dificuldades. Solidariedade porque quando vemos alguém enfrentando dificuldades, colocamo-nos no lugar desta pessoa e acabamos por ajudar. Ajudamos um cego a atravessar a rua. Contribuímos com o lar que cuida de crianças com síndrome de Down. Contribuímos com o Criança Esperança. Colaboramos com a Campanha do Agasalho.
Assim, os carecas, os fracotes, os baixinhos(lembram do baixinho da cerveja Kaiser?) despertam um sentimento duplo: o de solidariedade e o de rejeição. As pessoas oscilam entre querer ver iguais a si na tela da TV e entre ver o sonho, o perfeito.
Na verdade, o sonho da perfeição é o que explica, por exemplo, o sucesso do casamento até hoje. O casamento (principalmente na Igreja Católica) é um ritual com muitos detalhes. A promessa da felicidade (e da fidelidade) "até que a morte os separe" é uma idealização. A idéia da mulher de branco, imaculada, é outra. São símbolos, mas não realidade. Todos temos pensamentos bons e maus. Dias bons e dias ruins. E, antes que algum gaiato se aproveite, dias em que escrevemos colunas boas e dias em que escrevemos colunas ruins.