Von, o previdente
Como Von foi parar no Diário de Notícias, não sendo jornalista nem tendo alma pra tanto, são coisas do jornalismo antigo. Conhecia idiomas, empregou-se …
Como Von foi parar no Diário de Notícias, não sendo jornalista nem tendo alma pra tanto, são coisas do jornalismo antigo. Conhecia idiomas, empregou-se primeiro na aHora (assim mesmo, com esse "a" minúsculo antes do H maiúsculo), como tradutor de telegramas, nos tempos pré-históricos, ainda antes do teletipo, quando as agências de notícias transmitiam seus "despachos" em Código Morse.
Contratava-se um telegrafista, geralmente dos Correios e Telégrafos, ou da Telefônica, ou da Viação Férrea, para captá-los, letra por letra, palavra por palavra, em inglês ou espanhol. O rascunho era ado aos tradutores - Von entre eles - para serem vertidos ao português.
Veio o teletipo, as transmissões aram ao português, os tradutores antigos acabaram transformados em redatores da Editoria Internacional. Foi lá que o Von praticou suas melhores façanhas. Em determinada semana, de grandes acontecimentos internacionais, o Diário de Notícias foi furado pelo Correio do Povo nas notícias mais quentes.
Todo o santo dia, a mesma ladainha. Olinto Oliveira, editor-chefe, aborrecido com o furo, indagava do Von:
- Não veio esta notícia pra nós? Tens certeza?
- Absoluta - respondia o Von. - Não veio.
Quando chegou o fim de semana, com ele veio o sacrifício de fechar a edição dominical. O mundo inteiro pára sexta-feira ao entardecer. Com equipe reduzida, sem ter a quem mandar fazer matéria, Olinto não encontrava o que pôr nas páginas. Perguntou ao Von, num réstia de esperança:
- Não tens nada para pôr na edição?
- Ahaha! - foi a resposta triunfante. - Eu estava adivinhando que ia faltar matéria no domingo.
Abriu a gaveta e de lá tirou todas as notícias importantes que havia escamoteado durante a semana.
- Sou um homem previdente! - sentenciou triunfante, do alto de sua sabedoria.