Vida a dois, três, quatro…
Quatro estrelinhas daria Fu Lana para Fatal, filme de Isabel Coixet, com Penélope Cruz, Ben Kingsley, e o carismático Dennis Hopper. Os críticos certamente …
Quatro estrelinhas daria Fu Lana para Fatal, filme de Isabel Coixet, com Penélope Cruz, Ben Kingsley, e o carismático Dennis Hopper. Os críticos certamente darão três, pensou ela ao perceber que o filme tem algumas soluções lacrimejantes, predeterminadas do melodrama. No entanto, não serão lágrimas banais derramadas apenas no cinema e, sim, fruto de um verdadeiro desespero provocado por Philip Roth, escritor americano que levou o Pulitzer pelo texto de "O animal agonizante", no qual é baseado o filme.
A história é atualíssima: traz os medos que acompanham os relacionamentos modernos, principalmente aqueles que ocorrem entre pessoas com maior diferença de idade. Pensando bem, sempre viveremos em uma sociedade hipócrita, onde tudo é aparentemente aceito, porém, apenas na teoria. As pessoas serão balizadas pelos próprios preconceitos que impedem as decisões baseadas na vontade própria. O que nos conduz à indecisão. E, o pior, a decisões erradas.
O mundo já viveu todas as rupturas nas regras de convivência, e tudo deveria ser possível, no entanto o homem segue questionando. O pior inimigo agora é ele mesmo e seus fantasmas. Se você tiver mais de 70 anos e se apaixonar por alguém de 24, não poderá conviver tranqüilo. Haverá um estigma diariamente a seu lado dizendo que você irá perder aquele amor mais jovem para um concorrente mais capaz. O medo de ser traído o destruiria, mas a solidão seria um inimigo maior ainda.
Encurralado, o sujeito vive um drama. E paralisa.
Se, além de ter 70 anos, você for um defensor da liberdade de escolha, um liberal absoluto, que tem para si que o casamento é uma prisão (por já ter cumprido pena), o medo de estar apaixonado e dependente irá transformá-lo num ser verdadeiramente doente. Para quem trair para sobreviver à prisão do casamento sempre foi lema; para quem pregou que se deve amar muitas mulheres, sentir-se livre para trocar a parceria, divertir-se, deixar que o tempo e imperceptível sem se fixar em um relacionamento duradouro, o dilema será cruel e inevitável. Ao aproximar-se do fim da vida (que, sabemos, vem logo ali), quem vive sozinho não terá ninguém a seu lado. E na hora de sofrer por alguma doença, idem. É desesperadora a falta de conforto. Porém, os preços devem ser pagos. As escolhas pesarão para sempre. A dúvida persistirá em todas as gerações: monogamia ou amor livre?
A vida é um enigma. Me decifra e eu te devoro.
Por que um velho não pode se comportar como um um velho e abandonar as mundanas e incômodas armadilhas da imensa comédia humana? É a pergunta que dá início ao filme na mente do personagem David Kepesh. Essa pode ser a pergunta que domina também a vida de Philip Roth, que vive sozinho e que, tal qual seu personagem Kepesh em Fatal, irava a um amigo escritor, poeta e inspirador, revivido no filme por Dennis Hopper. Cada vez que Hopper surge na tela e na vida de Kepesh, acreditamos que a vida sempre terá uma solução, um andamento suave, desde que possamos contar com um sorriso sincero, uma bronca ou com o apoio incondicional dos que nos amam desinteressadamente. Talvez os que melhor nos compreendam não sejam nossos pares, nem nossos herdeiros, mas sim um amigo, a quem destinaríamos o último beijo antes de expirar. A morte nos assusta, mas a solidão petrifica.
Fatal é uma experiência emocional, um treino, uma hipótese para testar nossa capacidade de aceitar todas as hipóteses. O filme vai se apresentando aos poucos, e nós, os espectadores, vamos conduzindo e sendo levados pelo andamento da história. Ao final, nos damos conta que fazemos parte daquele grupo social hipócrita, cheio de dogmas, do qual nos fala o tema, e saímos com a mesma sensação de arrependimento e de certeza de que queremos mudar. Para melhor.