Siga em frente, Rosane

Por Vieira da Cunha

À Rosane de Oliveira, toda a nossa solidariedade.

Com invulgar destemor, força, coragem e responsabilidade, eis aí uma jornalista que tem enfrentado os exageros e desvios do Poder Judiciário como quase ninguém na imprensa brasileira. Não se abala com ameaças, não se deixa humilhar por ofensas dos que se sentem contrariados. Frágil à primeira vez, esta mulher se agiganta a cada vez que usa as teclas de seu computador, munida especialmente pelo caráter que herdou de uma família criada entre mãos calejadas no interior do interior. Aponta, às vezes com ousadia, outras vezes com evidente desassombro, as incoerências, desvios e escorregões de juízes e desembargadores, de juízas e desembargadoras.

Falo com conhecimento de causa. Conheço Rosane desde que iniciou no Jornalismo, jovem tímida porém determinada, abrindo espaços em um ambiente que, nos anos oitenta, ainda era francamente dominado por homens. Convivemos durante cerca de dois anos na redação do Correio do Povo, eu já avançado na hierarquia, ela uma repórter de política abrindo veredas nesta selva habitada por felinos de todas as espécies - ariscos, astutos, vorazes.

Com tenacidade e dedicação tornou-se a mais importante colunista de política do Estado. O ônus é que se obriga a conviver, e o faz com sobriedade e paciência, no círculo envenenado das redes sociais, no qual despontam os covardes de todo o gênero, aqueles que abusam do anonimato para vomitar palavras que não ousariam proferir em público, muito menos face a face com quem querem atingir. No ambiente social e político envenenado que nos cerca, Rosane é odiada por quem lê opiniões que confrontam com a sua, injuriada pelos que a criticam, caluniada pelos mascarados da covardia. 

Sua integridade, honestidade e coerência, das quais, repito, sou testemunha, lhe asseguram uma independência soberana e uma isenção crítica incomuns. Rosane é um baluarte daqueles que confiam em que o jornalismo profissional se destaca e é respeitado por servir à democracia. Servir à democracia significa não se curvar aos poderosos, entre os quais, inclua aí na primeira fileira, despontam os que confundem defesa do Judiciário com salvaguarda de seus interesses.

É o caso, agora, tanto da desembargadora aposentada Isis Helena Medeiros Nogueira, que processou Rosane e o jornal Zero Hora, como da juíza Karen Rick Danilevicz Bertoncello, que num evidente movimento corporativo assacou a sentença condenatória para um comentário que reproduz informações contidas no site oficial do Conselho Nacional de Justiça. A Sra. Isis sentiu-se ofendida por ver publicada na letra fria da imprensa que em um único mês recebeu R$ 662 mil, o equivalente a 508 salários mínimos da época - ou, em valores corrigidos, a obscena quantia de R$ 892 mil. Explica-se aí a fúria da querelante: quase um milhão de reais em um único mês é mesmo valor capaz de constranger quem a recebe sendo funcionário público.

Rosane, sabemos muito que a prática do jornalismo está muito mais difícil hoje do que há cerca de quatro décadas, quando começaste nesta longa jornada. Sabemos muito bem que investigar, analisar, informar é o dever de quem abraça esta profissão. E descobrir e revelar o que alguém quer esconder está entre os princípios fundamentais do jornalismo. E a verdade, sabemos, pode ser muito inável.

Disse certa vez o amigo Eugênio Bucci que Jornalismo é o idioma pelo qual a instituição imprensa fala com o público. É isso, Rosane. Siga assim, não se dobre, não se intimide por desnudar a verdade, por mais constrangedora que seja.

Autor
José Antonio Vieira da Cunha atuou e dirigiu os principais veículos de Comunicação do Estado, da extinta Folha da Manhã à Coletiva Comunicação e à agência Moove. Entre eles estão a RBS TV, o Coojornal e sua Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, da qual foi um dos fundadores e seu primeiro presidente, o Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, a Revista Amanhã e o Correio do Povo, onde foi editor e secretário de Redação. Ainda tem duas agens importantes na área pública: foi secretário de Comunicação do governo do Estado (1987 a 1989) e presidente da TVE (1995 a 1999). Casado há 50 anos com Eliete Vieira da Cunha, é pai de Rodrigo e Bruno e tem cinco netos. E-mail para contato: [email protected]

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