Sem ilusões

O Coletiva noticia hoje que a Revista Imprensa está publicando, em sua edição de junho, uma ampla pesquisa sobre liberdade de imprensa. Bem-vinda pesquisa, …

O Coletiva noticia hoje que a Revista Imprensa está publicando, em sua edição de junho, uma ampla pesquisa sobre liberdade de imprensa. Bem-vinda pesquisa, já que temos o mau costume de pensar que sob regimes ditos democráticos esta ferramenta do poder não existe ou, nos consolando, relembrar velhos tempos de ditadura escancarada quando o quadro era mais explícito. No site da publicação há ainda uma interessante análise sobre a pressão diária sofrida por quem exerce sua atividade na comunicação social. "Na rotina das redações, entretanto, os censores estão presentes de diferentes formas e nem sempre são identificáveis a olho nu. A ampla maioria dos jornalistas ouvidos pela pesquisa IMPRENSA/MaxPress/Aberje - 86% - revelou que já sofreu pelo menos dois tipos diferentes de pressão. A modalidade mais citada de ingerência é manifestada na forma de pedidos de não-publicação ou divulgação de matéria. No ranking da pressão sobre a imprensa, a ameaça de processo jurídico ocupa a segunda colocação, seguida de manipulação de dados, ameaça física, ameaça de demissão e demissão efetiva."


Não existe ilusão nesta profissão. Nem mesmo quem tem veículo próprio, seja impresso, eletrônico ou virtual, sabe que, cedo ou tarde, vai ter que usar sua cintura para o jogo necessário. Ou não sobrevive. Portanto, deixemos de ser idealistas.


Parece, porém, salvo análise mais aprofundada, que a internet ainda é o lugar mais liberado para que as pessoas, jornalistas ou não, exerçam seu direto de livre-manifestação. Com todos os erros e acertos possíveis.


Há alguns meses, reativei meu blog e o que era atempo virou coisa séria. Hoje, me sinto comprometida a atualizar no mínimo diariamente o material que lá deposito. Isto porque, mergulhada no mundo dos blogueiros, comecei a observar que, salvo exceções, quem bloga encara a tarefa com seriedade. E isso não se aplica a vetustos senhores. Há uma garotada inquieta com esta batata quente que nos botaram nas mãos e que vamos jogando de uma para outra, enquanto tentamos entendê-la e dela usufruir com prazer e com responsabilidade.


Respondi, ontem, a um meme (uma espécie de corrente em que um lança um tema e convida outros para discorrer a respeito) do Chamberlaws, tocado por três garotos da cidade paulista de Hortolândia. Eles me colocaram na parede para fazer uma crítica fundamentada sobre a blogosfera, do layout ao conteúdo.


Zapeando por este mundo blogueiro que não tem fim, a gente encontra de tudo. De blogs que se pode chamar de institucionalizados, como o do Reinaldo Azevedo, da Veja, claramente voltado para o debate político, até aqueles que se limitam a colar na página uma imagem com link para o e duas linhas de legenda, sem preocupação com discurso. Palavrão, tem de sobra, para todos os gostos e situações. Acusações, defesas, teses, tudo isso rola pela rede aparentemente sem controle.


Mas não é bem assim. Num dos blogs linkados por um dos meus habituais parceiros de troca de comentários, encontrei um que se queixava que havia sido tirado do ar pelo Ministério Público sob acusação de fazer apologia de drogas. A gente, ao ler, não sabe se ri ou se chora, porque a queixa do rapaz é tão sincera que quase nos faz pensar que se afirmar como consumidor de droga é uma coisa banal e que a comunidade que se forma em volta não sofrerá nenhuma influência ou influenciará quem quer que seja.


Acho que o exemplo se presta para a discussão sobre o que é censura, o que é controle de conteúdo ou de faixa etária. Até que ponto um cara, com um espaço livre na internet, pode ficar trocando figurinha com a gurizada sobre drogas? E até que ponto o Estado pode interferir? Eu sempre defendo a idéia de que crianças e adolescentes devem ser tutelados pela família e, quando em sala de aula, pelos educadores, para ver o que lêem, o que ouvem e o que assistem. Esta semana ouvi, estupefata, uma conhecida dizer que o filho não incomodava, ficava horas no quarto, na internet, com seus "joguinhos". Quando perguntei se ela sabia o que ele estava ando na internet, me respondeu, candidamente: "Ah, ele fica no msn falando com os amiguinhos, eu não fico em cima". Pois é. E eu ainda me impressiono com blogs de gente maluca.

Autor

Jornalista formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Maristela Bairros já atuou como redatora, repórter, editora e crítica de teatro nos principais diários de Porto Alegre, colaboradora de revistas do Centro do País e foi produtora e apresentadora nas rádios Gaúcha, Guaíba AM, Guaíba FM e Rádio da Universidade, assessora de imprensa da Secretaria de Estado da Cultura e da Fundação Cultural Piratini. É autora de dois livros: Paris para Quem Não Fala Francês e Chutando o Balde, o Livro dos Desaforos, ambos editados pela Artes & Ofícios.

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