Seixos
Por José Antônio Moraes de Oliveira


"- Onde o homem sábio esconderia
um seixo?", perguntou o Padre Brown.
E ele mesmo respondeu:
"Na praia".
G.K.Chesterton.
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A arte da dissimulação deve ser tão antiga como a humanidade. A história está repleta de episódios emblemáticos, quando ocultar emoções foi necessário para salvar vidas - ou almas. O escritor inglês Gilbert Keith Chesterton produziu textos antológicos sobre a fraqueza e a fortaleza humana. Dizia que sentir vergonha dos sentimentos, não a de uma tola negação da nossa fragilidade. E que quanto mais forte a armadura, mais frágil é o ser que a habita.
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Em 1844, Edgar Allan Poe escreveu o conto "A Carta Roubada" que se tornou um clássico no gênero policial e uma parábola sobre dissimulação e ocultação. Quase 70 anos depois, o conto é "reescrito" por Gilbert Keith Chesterton, como um roteiro para seu mais famoso personagem, o Padre Brown. A versão de 1911 apresenta um dos típicos paradoxos chesternianos, quando o padre-detetive afirma:
"Pela nossa experiência, todo homem concebido
como santo pode ocultar um criminoso.
E suspeito que todo homem acusado como
assassino pode ser um santo".
O detetive original de "A Carta Roubada" estava à procura de um precioso documento desaparecido. Para Edgar Allan Poe, se existe alguma coisa que ninguém consegue ver é porque se encontra à vista de todos, pois o esconderijo mais oculto é aquele que, de tão óbvio, não parece ser um esconderijo.
Na narrativa de 1911, o Padre Brown descobre que a chave para deslindar o mistério da carta desaparecida não estava na carta, mas no carteiro que a entregou. O princípio permanece o mesmo: o melhor detetive será o que tem olhos para descobrir aquilo que nunca esteve escondido. Como o segredo de um personagem, que de tão simples, não aparenta ter segredos. Aqui está posta a parábola sobre dissimulação e ocultação - não se trata de procurar uma agulha no palheiro, mas de entender porque a tal agulha foi parar no meio da palha. Para fechar o enigma, o Padre Brown devolve a pergunta ao seu interlocutor:
"- Onde o homem sábio esconderia
uma folha?".
E ele mesmo responde:
"Na floresta".
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