Retalhos

Natal, lembrança das perdas. Ano Novo, esperança de não perder mais nada. O que preciso, invento, o que não, deixo para os outros. Socialmente, …

Natal, lembrança das perdas.


Ano Novo, esperança de não perder mais nada.


O que preciso, invento, o que não, deixo para os outros. Socialmente, só minto por delicadeza para levantar a auto-estima, sem prejuízo para ninguém, de mulher feia a imbecil inócuo. Minto muito mais para mim mesmo que para os outros. Invento o que preciso quando a realidade está doendo muito. Outro dia mesmo, inventei que um amigo ainda estava vivo. Eu precisava disso há mais de dez anos.


O auto-aumento dos subsídios aprovado pelas lideranças do Senado e da Câmara dos Deputados, de tão inusitado, arrancou de um respeitado jornalista expressões também inusitadas: "Mais do que vergonha, tenho asco, repugnância e nojo do atual Congresso."  (Villas-Bôas Corrêa, do Jornal do Brasil, repórter político há 58 anos).


Acho esse aumento tão patético como dar facadas em moribundo.   


Perguntar não ofende:


Quando um jovem pega uma metralhadora e desce o morro, isso tem alguma coisa a ver com os subsídios e benefícios dos senadores e deputados serem mais que 100 vezes o salário mínimo? Ou que cada sessão da Câmara pode valer R$ 12.546?


Quando juízes são assaltados, é apropriação indébita ou cobrança atrasada? O Bolsa-Família é para evitar "A bolsa ou a vida!"?


Será que não está na hora de repensar o Parlamentarismo, sistema no qual os parlamentares são mais vigiados pelos eleitores?


Enquanto se diz que o problema brasileiro é o da distribuição de renda, eu afirmo o contrário: é o da NÃO-distribuição de renda.


Enquanto mais de 100 milhões de brasileiros trabalham muito para apenas comer, modelos morrem de fome para ganhar mais que juízes, senadores  e deputados. Paradoxo?


Enquanto milhares de pessoas morrem - diariamente - de desnutrição e fome, uma morte por anorexia vira notícia nacional. Não vi ninguém escrever que ir contra o próprio biótipo tem sintomas de burrice.


Capítulo da tragicomédia brasileira:


"Se você conhecer uma pessoa muito idosa esquerdista, é porque ela tem problemas. Quem é mais de direita vai ficando mais de centro, e quem é mais de esquerda vai ficando social-democrata".


Dias antes de dizer isso para empresários, em São Paulo, e aprofundando o oco cultural com uma pobre metáfora sobre a cor dos cabelos e a ideologia, Lula, de acordo com Tereza Cruvinel, do Jornal do Brasil, mandou uma carta de três páginas para Fidel Castro, em 2 de dezembro, assinando a mesma como "seu amigo e companheiro".


Escreveu Tereza: "Depois de enaltecer a revolução cubana, que despertou em tantas gerações o desejo de mudar, "por vários caminhos", a face injusta do continente, Lula enumera os presidentes de esquerda eleitos ou reeleitos, afirmando que as sementes da revolução cubana frutificaram, devendo todos por isso dizer "Gracias, Fidel"".


Pergunto eu: o que se esconde por trás da cara-de-pau desse presidente camaleão? Dizer besteiras é o trivial simples, mas desmentir o que escreveram para ele ? É dose!


Para relaxar o leitor, lembro um brilhante improviso do falastrão no Hospital das Clínicas (SP), tentando afagar o ego do ex-ministro e cirurgião Adib Jatene.


"Quando as pessoas morrem na mão do Jatene, mesmo que ele tenha feito um erro, todo mundo morre satisfeito, morreu na mão do melhor". 


Sou um dos 30.075.259, entre 125.913.479 eleitores brasileiros, que se abstiveram, votaram em branco ou anularam o voto. Votei em Cristovam Buarque e, no segundo turno, achando muito constrangedor votar no Geraldo - voto inútil -, votei em branco. Dizer besteiras ou cada dia dizer uma coisa (de acordo com a platéia), não impede ninguém de ser presidente. Enquanto for apenas patético, parte dos brasileiros tem que se curvar face à maioria e engolir o sapo.


Tenho pena dos humoristas, pois têm que enfrentar um concorrente com divulgação certa em todos os meios de comunicação.


Quando chefe de reportagem da Última Hora gaúcha, comecei a receber crônicas de um senhor bastante idoso, mas super-respeitado industrial, já afastado da direção de suas empresas. As crônicas eram infantis e, apesar de ver algumas publicadas em outros jornais, as que recebi foram para a cesta de lixo. Mesmo assim, recebi a visita de um descendente do empresário, pedindo que não publicasse nada do que eu recebia, pois o fato era constrangedor. Enquanto outros publicavam as crônicas, numa pseudooperação "puxa-saco", eu me guiava pelo bom senso. Essa lembrança ocorreu-me face à figura do Ministro da Defesa, Waldir Pires, a quem o país e a democracia devem excelentes serviços, pois o "apagão aéreo" tem arrancado do Ministro as mais estapafúrdias declarações. Face às suas "crônicas", que creio produtos da idade, acho melhor um parente pedir ao Lula uma saída honrosa que o ado do Ministro merece.


A mídia, cujo nome correto é "media" ("meios", no plural latino), no século ado, foi concluindo as décadas por conta própria, até quando deu. Inventou, por exemplo, que a década de 80 começou em 1980. Burrice, 1980 foi o último ano da década de 1970 que começou em 1971. A mídia brasileira só jogou a toalha na última década, pois ninguém iria engolir que o século XXI começaria no ano 2000.


Auto-ajuda é uma forma muito delicada de dizer "vire-se". O clássico livro do gênero é do Dale Carnegie, um americano que em 1937 lançou o best-seller Como fazer amigos e influenciar pessoas, muito vendido até hoje em dezenas de idiomas. Há mais de 40 anos, numa Feira do Livro de Porto Alegre, Mario Quintana disse-me que escreveria um livro de auto-ajuda fundamental: Faça tu mesmo os teus filhos. Eu, talvez, escreva um: Não me ajude a errar.


Diante da história dos Estados Unidos, um livro que faria sucesso lá é Mate você mesmo o Presidente.  Aqui, como os bem alfabetizados são minoria entre os eleitores do reeleito, creio que um livro do tipo "como ar um guia que é filho de uma mãe que nasceu analfabeta" poderia ter boa vendagem.


Ajude-se: quem paga a sua aventura de viver é você mesmo. Inclusive comissões, férias, 13º, abonos e todos os benefícios. Lembre-se que nessa aventura você é absolutamente autônomo. Seja feliz, apesar de?



Inté.



Em tempo:


A primeira e última vez que me confessei, assustei tanto o padre que achei pecado me confessar outra vez.


Recebi, abrandei e dou ciência:

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Autor
Mario de Almeida é jornalista, publicitário e escritor.

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