Realidade deturpada

Nunca fui a favor de moralismo. Acho que coisas caretas demais tendem a esconder desejos ou impulsos muito reprimidos. E que podem acabar aflorando …

Nunca fui a favor de moralismo. Acho que coisas caretas demais tendem a esconder desejos ou impulsos muito reprimidos. E que podem acabar aflorando de outra forma. De mais a mais, ninguém é 100% certinho, todo mundo tem loucuras e esquisitices. 


Isto dos padres católicos não terem vida sexual, por exemplo. Não consigo entender de onde surgiu esta idéia maluca. Para que privar alguém de sua vida sexual só porque se torna padre? Que punição! E isto, claro, é impossível. Ninguém consegue simplesmente eliminar seus desejos sexuais. Aí, os padres buscam formas de dar vazão aos desejos que, ao contrário do que a Igreja Católica prega, são muito humanos. Carnais, mas humanos. Renegar a isto é renegar a própria condição humana. Sem falar que não consigo acreditar em um padre dando conselhos a um casal, se ele nunca foi casado. Me desculpem os católicos fervorosos, meu email está lá embaixo, podem protestar.


Apesar de ser contra o moralismo careta, tenho que reconhecer que o "liberou geral" está indo longe demais. Outro dia, estava ouvindo uma rádio jovem e o vocalista dizia, na letra da música, que iria se masturbar (ele usou outro termo, mais corriqueiro) para a moça em questão. Agora, uma banda gaúcha fez uma letra que tem conotação realmente duvidosa, com um viés incestuoso e pedófilo. Antes de crucificar, quero ver a versão do grupo, mas acho que este tipo de liberdade não liberta.  Ela, na verdade, deturpa a realidade. E não falo só desta música, mas de todas as situações exageradamente liberadas.


Sob a alegação da liberdade, tudo está sendo permitido. Mas isto não é bom. Primeiro, porque a turma do "no tempo dos militares era muito melhor" está se mexendo, ficando inquieta. Não era melhor mesmo, era muito pior. As pessoas confundem as coisas, achando que não havia tanta criminalidade porque os militares estavam no comando. Mas não era por isto. O mundo era infinitamente melhor, do ponto de vista econômico. Assim, a violência e a criminalidade eram muito menores.


Não quero militares no comando, não, por pior que esteja o mundo. As pessoas têm é que assumir seu papel. Se o mundo está doido, foi porque nós, homens, o deixamos assim. E temos poder para mudá-lo também. Basta que as pessoas amadureçam e tomem a frente das coisas. Evoluirmos para um mundo livre e sensato é muito mais trabalhoso, porque temos que tirar a bunda da cadeira, discutir, participar e refletir. As pessoas preferem deixar que alguém (os militares, por exemplo) decida. Isto é imaturidade e preguiça. Não quero ninguém decidindo por mim. Quero resolver sozinho, com os acertos e erros, pois minha vida é uma só.


Agora mesmo, li aquela notícia de que os americanos estão recorrendo a espécies de "conselheiros", que os ajudam na tarefa de dizer não aos filhos, ensiná-los a andar de bicicleta, entre outras coisas. Por favor! É o cúmulo da imaturidade e da preguiça! Alegam que não têm tempo. Bom, mas tem tempo para quê, então? Como é que um ser humano destes coloca um filho no mundo? Ninguém substitui os pais, ainda mais se estes estão presentes quando o "conselheiro" age. Talvez o que ocorra seja a autoridade dos pais diminuir aos olhos dos filhos e estes arem a respeitá-los menos, isto sim. Mas o que me chama atenção é que estes cidadãos querem simplesmente lavar as mãos e deixar que outros resolvam.


O início e o final desta coluna levam ao mesmo ponto: se deixarmos a coisa correr solta demais, alguém vai decidir por nós. É mais fácil? É. Mas e se decidirem por algo que não quero? Não poderei reclamar, pois eu deleguei aos decisores este poder. Na época do regime militar, só para retornar ao exemplo, as pessoas foram tolhidas de inúmeros espetáculos artísticos porque um censor achava que falar bunda era ofensivo à moral e aos bons costumes. Ofensivo é ver os deputados e senadores em Brasília, vivendo na Ilha da Fantasia enquanto o povo morre de fome, de doença nas filas do INSS, de tristeza.


Então, tomemos a frente das decisões. Chega de deixar a coisa tão solta assim. Vamos colocar referenciais para a nossa gurizada, pois eles pedem por isto, precisam. Como diz a música-tema da nova campanha da RBS, "educar é ensinar que há limites para tudo, menos para os sonhos que a gente tem". E eu sonho com um mundo bem melhor do que este. 

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