Por que temos que salvar a democracia?

Por Elis Rann

É comum associarmos a democracia ao ato de votar. Mas a democracia é muito mais do que isso: a democracia nos dá o direito a ter direitos. Inclusive, a democracia nos dá o direito de criticá-la. E entre uma crítica e outra ou diante de tantas críticas, há quem fique com dúvida sobre as virtudes da democracia.

Vivemos em uma república democrática, que é guiada por uma constituição que estabelece direitos e deveres mínimos. A nossa "carta magna" garante a igualdade de direito civil perante a lei. Significa que não podemos ser discriminados por nossa religião, por nossa cor, pela nossa origem, gênero ou orientação sexual. Cada pessoa é uma pessoa e deve ter as mesmas garantias constitucionais. 

Atualmente, 1/3 dos gaúchos não confiam na democracia e acreditam que, em algumas circunstâncias, um governo autoritário é preferível do que uma democracia. Entre os mais jovens, ¼ acredita que não há diferença entre uma democracia e uma ditadura.

A decepção com a democracia está associada a vários fenômenos. Existem os que são contra a democracia por sua ideologia, apregoam que é necessário um regime político autoritário, podendo utilizar a violência para definir o que é "certo" e censurar o que não pode ser dito ou realizado.

Tem os que estão descrentes e associam a democracia à usurpação da esfera pública e, principalmente, aos escândalos de corrupção. Para os eleitores que estão descrentes com a política é conveniente condenar e responsabilizar a democracia. 

Os indiferentes com a democracia são aqueles que estão alienados do debate, por opção ou por falta de informação. Esse grupo não compara a democracia com a ditadura, simplesmente considera que esse tema não lhe diz respeito e não afeta a sua realidade. 

A existência da democracia permite que essas pessoas manifestem a sua insatisfação com a própria democracia, permitindo até que se avalie a possibilidade de uma ditadura. O inverso não existiria, se vivêssemos em uma ditadura não teríamos o direito de criticá-la publicamente.

A democracia é algo que nos permite o contraditório, a reflexão e a evolução. A democracia permite o debate, o embate, a releitura das regras, a revisão das leis e a ampliação de nossas garantias fundamentais. 

Algumas vezes a democracia parece inoportuna para a sociedade, pois ao permitir o diálogo contínuo, amplia o tempo das discussões e posterga o prazo para decisões. Ao dar voz aos diversos segmentos das minorias, traz a sensação de sufocamento da maioria. 

Estamos tão acostumados com a democracia que, na verdade, não temos nem ideia de como seria a vida sem ela. Não conseguimos nem imaginar a vida sem liberdade de expressão, sem ter o direito à livre associação ou a direitos civis, como as cotas e a união entre pessoas do mesmo sexo. 

Temos que salvar a democracia, cuidando e valorizando-a. Salvar a democracia significa compreender o seu significado e contribuir com sua consolidação. A nossa democracia tem inúmeras imperfeições, mas se é ruim com ela, seria muito pior sem.

Autor
Elis Rann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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