Perón, Perón
“Perón, Perón” são os ecos longínquos que vão permear no melhor estilo a aparição de Nestor Kirchner e sua esposa no balcão da Casa …
"Perón, Perón" são os ecos longínquos que vão permear no melhor estilo a aparição de Nestor Kirchner e sua esposa no balcão da Casa Rosada nesta quinta-feira, dia 1º, quando o público, que se estima em milhares, pedirá que se apresente à eleição presidencial na Argentina em 2007. Um exemplo da romaria de todos os fantasmas latino-americanos que assustam, mas já não espantam. É o que se percebe desde o Rio Bravo até a Terra do Fogo, um território de 450 milhões de pessoas que dão vida a 22 países. Uma América Latina que se mostra fragmentada, como se viu há 15 dias na reunião entre a União Européia e os latino-americanos.
Trata-se da primeira mudança democrática que ocorre na América Latina. A agência EFE e El Pais procuraram saber o que os intelectuais latino-americanos, mais atingidos pelas alterações do que os brasileiros, pensam das mudanças que estão ocorrendo. Conclui-se que os fantasmas sufocados da América Latina começam a aparecer. Uma razão talvez é que os Estados Unidos estão embrenhados no Oriente e relaxam "seu quintal". Mas o que existe é uma febre por uma nova América Latina. O escritor Eduardo Galeano adverte que dirão que as coisas não estão claras, e é verdade: "Numa situação nebulosa é preciso voar como os morcegos". Aqui os depoimentos pouco otimistas dos intelectuais.
"O divórcio entre a palavra e o ato"
Eduardo Galeano, escritor: "Os processos são complexos. Numa situação nebulosa é preciso voar como os morcegos. Estas energias pedem para lutar contra a cultura da impotência, essa herança colonial que nos impede de voar com nossas próprias asas, e contra a ditadura do medo e que, em nome do realismo, nos impõe a resignação. E também lutar contra a terrível transição que divorcia a palavra do ato".
"Nunca votei e nunca votarei"
Álvaro Mutis, escritor e poeta colombiano, prêmio Príncipe de Astúrias das Letras de 1997, resume o sentimento tão legendário quanto real do mundo latino-americano: "Nunca votei nem votarei. Os políticos me pareceram todos um desastre de egoísmo. Aqui estamos chegando ao nível mais crítico desse registro de egoísmo e cinismo. Não creio nem na esquerda nem na direita. Tudo são pretextos cínicos para tomar o poder e ganhar dinheiro. Mas há um limite: a impunidade da classe governante, que em quase todos os países aceita a democracia, mas a rigor quase não a leva em conta. As crises do continente são econômicas e sociais, de racismo interminável. Além disto, a democracia é substituída por mercadologia, o que transforma os candidatos em produtos e cidadão em falsos consumidores".
"É hora da discórdia"
"É a hora da discórdia", diz Horácio Gastelhanos Moya, de El Salvador. "Não há revolução, mas sim caricatura e fanfarronadas, não há renovação, mas apenas um desespero das massas empobrecidas. Não há uma guerra nem um modelo. Os Estados Unidos estão metidos em suas próprias crises e a Europa está longe. O que voga é o caos".
"Nenhum futuro coerente e esperançoso"
O artista peruano Fernando Brice diz que em um ano há 10 eleições presidenciais, e o novo mapa deve ser visto com cautela: "Entre as tendências populistas e autoritárias, hoje revestidas de discurso antiimperialista.e a nova centro-esquerda liberal,o que dá na mesma, não vejo nada que se assemelhe a uma idéia de futuro coerente e esperançoso".
"Revolução frágil"
Para o historiador equatoriano Leonardo Valência, "é uma revolução frágil e cultural que surge do cansaço pela exploração indiscriminada, do enfraquecimento da habitual ingerência dos EUA na América Latina, por ter tantas frentes abertas no Oriente e no Oriente Médio. Mas faltam políticos de nível que tenham voz para não se submeter aos interesses capitalistas".
