Patrulha de novo, não!!!
Tá bem. Ela sempre curtiu essa história de patrulha, fazer o certo, pensar prá frente e em grupo. Tipo: regrinhas saudáveis. Só que tem …
Tá bem. Ela sempre curtiu essa história de patrulha, fazer o certo, pensar prá frente e em grupo. Tipo: regrinhas saudáveis. Só que tem aquele bolchevique (no pior sentido, é claro) que diz: pô, mas Simpsons numa hora dessas? E aí, aqueles dois psicanalistas-bala que escreveram sobre o tal desenho e outros mais, são atirados na lata do showbusiness da comunicação e, dá-lhe regras, vamos gostar só do que a turma gosta. Tá bem, Leila Diniz é muito melhor. Foi lêgas, sem dúvida nenhuma. Só que há uma distância mínima de tempo entre fazer Fu Lana temer alguma coisa, que fique fora do riscado, e o instante em que ela já estará rosnando. E não deu outra: pisa aqui do meu lado, dizia ela para um cara que perguntou porque ela não falava de coisas sérias, ao invés de ficar tergiversando sobre os enlatados. Fula, a Fu Lana (boazinha essa, hein revisor?) retirou-se do salão onde estavam: ela, um bando de jornalistas, todos engravatados, e ele, o debatedor, de abrigo e tênis surrados. Ou seja, ele era da sua turma.
Fu Lana chispou dali e entrou na primeira livraria de esquina, tentando responder porque não atacava os caras pela jugular já que pela palavra estava ficando difícil e aconteceu aquele encontro cor-de-rosa, cinza e lilás, com aquele livro que a abrigou em solidariedade: Gran cabaret demenzial. A vingança nunca tarda. Falha de vez em quando, mas não tarda.
Deliciou-se com a linguagem solta e sem preconceitos de uma menina (pensou ser uma menina) que não tem medo desses trouxas de patrulha. Não tem medo da academia, nem da própria sombra. Porque todo mundo que escreve tem um medinho atrás de si, ou na frente, em algum lugar escondido, perseguindo, calculando a hora de dar o bote. Ela, a menina, não fica escrevendo e apagando, mudando e reescrevendo a cada vez que senta à frente do computador. Pelo menos isso é o que Fu Lana pensa sobre o método de quem ela nunca viu trabalhar. Vai com tudo, palavra a palavra que, parecem, já nascem prontas e encadeadas numa velocidade estonteante. E tem gente que compara a coitada até com a surfistinha. Meu Deus! Por que nos abandonaste?
A garota tem tudo para libertar a cabeça de uma, duas ou mais gerações e não é porque ela é filha do chefe. Isso não tem nada a ver, seus maledicentes.
Se a menina não escrevesse assim, Fu Lana não teria acordado os vizinhos da sesta de um domingo escuro e chuvoso neste fim de mundão. Aliás, grande coincidência quando a garota (Fu Lana adora falar garota, menina, porque dá o tom do linguajar da gata, para seguir no ritmo do livro) fala sobre uma terra que fica no Paralelo 30. Observem a maldade reativa, porque ela deve ter sofrido pra caramba por estas bandas. Aqui onde falar em Simpsons, que é angelical perto dos assuntos do livro, já dá trabalho.
A terrinha esta que fica no paralelo trinta graus sul (liguem os neurônios seus loiros, hoje talvez carecas), é a terra de Jakoo. Calma, calma. Fica no Oceano Pacífico. Ah, bom. Ótimo aquilo. Fu Lana subia pela poltrona, descia pelo outro lado, gargalhava com vontade. O cara que trabalha ao lado, e é escritor, daqueles que não levam nem o cachorro para a praça, já havia batido na parede uma ou duas vezes. Os contos de Gran cabaret demenzial são algo de incomum. É não é modo de dizer. Aquele cara que a comparou com a surfistinha deve ter recebido a pauta cinco minutos antes de ir ao ar ou lido algumas resenhas destas que saem nos jornais, aquelas formadoras de opinião. Loucura. É bom salientar que Fu Lana só tem capacidade de falar mal assim de um sujeito tão conceituado porque, na verdade, ela nunca leu, e nunca lerá (olha a patrulha?) a história da surfistinha. Porque não se trata de sexo. Não se trata de pura escatologia. Trata-se afinal de uma certa escatologia sofisticada e absolutamente absurda e cômica. Pode-se dizer um surrealismo fantástico.
Os personagens, finérrimos e cultos, por exemplo, dão festas no intestino de um super-amigo. Duvidam? Fu Lana não contará mais nada. Detesta estraga-PRAZERES. E este livro é um prazer engraçado. Também triste, lacônico, inteligente. Mas é novo. Tem um ritmo alucinado pelo qual estamos desesperadamente procurando. Lá pelas tantas, igual a um bebê que ri da mesma piada, perde um pouco a força, mas logo volta com outro pontinho de luz.
Os poemas são daqueles que em três linhas de hai kai, dizem um soneto. E saem da cabeça de Verônica (aliás isso dá um livro) apenas palavras com profundidade suficiente para deixar um repertório atrás de si e em cada letra. Inacreditável. Gran cabaret demenzial (Cosacnaif).
Fu Lana ainda não decidiu para que idade ele serve. Ele fala de coisas que uma menina de doze anos devia saber antes de se tornar adulta, aqui dito da melhor forma, com muito esforço e reescrita para não escandalizar os leitores. É um livro importante na educação emocional das pessoas, que hoje precisam perder um ou dois dedos para entender o que é dor. No entanto, é forte para uma pessoa ingênua. Será que existe essa tal pessoa ingênua, com mais de doze anos? Há que se perguntar.
Na ilha pasteurizada de Jakoo, a gente fica com vontade de gritar o nome dela do alto das pedras de Torres: Verônicaaaaaa! para ele ficar ecoando por muitos e muitos anos, principalmente nos ouvidos de um certo cara de abrigo?
Ps: E para o design do livro? Tudo de bom!!! Só lendo pra crer.
*Gran Cabaret Demenzial - Verônica Stigger, CosacNaif, 2007