Pára, paranóia!

Esses dias, um conhecido medroso de um primo maluco de um vizinho assustado de um receoso amigo meu recebeu uma ligação a cobrar. A …
























Esses dias, um conhecido medroso de um primo maluco de um vizinho assustado de um receoso amigo meu recebeu uma ligação a cobrar. A pessoa identificou-se como funcionário de uma companhia telefônica dizendo que o seu telefone estava com linha cruzada e ela iria descruzar. Estranhou a ligação e disse-lhe que a telefônica não liga a cobrar nem para cobras; o funcionário insistiu para que ele discasse um certo número de cento e poucos algarismos. A pessoa desconfiou dos 3 dígitos finais, consecutivos, além disso o número era ímpar e divisível pela soma da raiz quadrada de um número primo. Suspeitou, lógico.

Ele não discou e falou em mímica com a polícia.


O policial disse-lhe que esta é uma ligação do Comando Furta-cor, das penitenciárias de insegurança máxima, e que este número, se acionado, é mais que um clone, é uma extensão de seu telefone, apto a dar mais despesas por impulsos, sem falar na ampliação crescente dos cruzamentos de linha.


A partir daí, eles ouvem tudo o que você fala e se for interessante para eles, começam a ameaçar. Ou se for muito desinteressante, ordenam você a melhorar os assuntos urgente, que assim não dá pra escutar, sob pena de perder a preferência nas ameaças. Também há casos em que a escuta resulta em aconselhamento de todo tipo, até orientação para discutir relação etc. Você é obrigado aceitar.


E é obrigado a fazer o seu computador a tremer nas teclas e a digitar contra a vontade dele essas mensagens paranóicas, que se espalham por entre cabeças pensantes. Pedem que avisem todos os familiares, até os que já morreram, amigos (inclusive os que deixaram de ser), principalmente os mais idosos, as empregadas e as desempregadas, os adolescentes, os recém-nascidos, os surdos e mudos e curdos, os distraídos, os otimistas e os ainda saudáveis da cuca, enfim, aqueles que, sem maiores preocupações, possam cair naquela conversa e nessa também e numas outras aí que nem é bom citar.


Porque acham que, além de uma doideira sem-fim, isto é sério e é extremamente perigoso, dizem. Para os tímpanos e para os olhos, digo eu, que também têm saco e também estouram, definitivamente impacientes, com essa repercussão insana e infantil.


O próprio policial pediu-lhe para divulgar esse alarme alarmante. E pediu, inclusive, que se conhecesse alguém da imprensa imprensada pelos mesmos telefonemas, que pedisse para que eles também divulgassem, mas não por telefone, pois estão ouvindo 25 horas por dia.


E que o golpe já está fazendo vítimas (paralisia mental, terror noturno e horror diurno, enurese sem urina etc), em várias localidades, sobretudo onde você está sentado neste exato momento, menos prejudicar as telefônicas, que acumulam contas lucrativas a partir do medo inicial, individual, multiplicado de aparelho para aparelho, até chegar à população inteira. Imagine o balanço anual.


Ouça, não é o seu celular chamando? Ou o meu? Não, é o da mãe do badanha. Ufa!




Claro que a teoria evolucionista de Darwin tem alguns
pontos obscuros. Bento XVI é um deles.

*

Um papa sem papas na língua não merece ser paparicado.

*


Com um papa tão áspero, mais adequado que
a água benta seria a água-rás.

*


Em vez de pedra da sua Igreja, Bento XVI tá mais para
pedrinha no sapato dos católicos.

*


Depois da hóstia sagrada, agora a hostilidade beatificada.

*


O provérbio popular ganhou inimaginável adaptação:
ir a Roma e evitar o Papa.

*


Etc.


(Colaboração original para o blog do Solda)
A Eneida Serrano tem lentes desde antes de adquirir lentes. Um dos artistas mais preparados para ser o que é, pois nasceu com um nervo ótico muito especializado - aquele que intui o imperceptível à primeira vista. E o que faz a Eneida é tornar suas percepções visíveis para nós todos. É o que eu acho que ela faz sempre, e que fez agora, magistralmente, com as suas peregrinações pela serra gaúcha, em busca de cenários interiores. São vários interiores, e não me refiro apenas aos quartos, às salas, o galpão. Claro que está lá, sem ela mostrar o lado de fora da região em torno das casas, o interior do estado. E claro que lá está o interior mais interiorizado, o daquelas vidas que a Eneida, sempre tão respeitosamente, visita. Ao entrar do seu modo, delicado e nunca invasivo, cria fotografias que fazem do observador um visitante também respeitoso diante de interiores do próprio tempo, algo no íntimo do imaginário, no fundo de nós mesmos. Quem sabe a alma do brasileiro, mais propriamente do gaúcho, mais exatamente do imigrante. E a quem se detém detidamente, as imagens revelam, por fim, nas camadas de tintas dos interiores em rosa e verde, o pentimento de épocas e de vivências. Para se emocionar com a sensibilidade exposta nesta série de fotos, esta nota não é nada. Visite sem falta a galeria Bolsa de Arte (Quintino Bocaiúva, 1115) ou pelo menos antecipe seu olhar, através do site www.eneidaserrano.com.br. Somente até o dia 28 de abril, o que é muito pouco.

Autor
Fraga. Jornalista e humorista, editor de antologias e curador de exposições de humor. Colunista do jornal Extra Classe.

Comments