O Real Motivo

Por Fernando Puhlmann

"Seja o mar...

Sabe por que estamos aqui?

Porque estamos vivos!

Liberte-se, não seja fugitivo!"

Samuel Gomes

Quem não tem medo de ficar pobre? Mas não estou falando de ficar apertado, de ter que fazer conta para chegar no final do mês, de abrir mão de pequenos luxos. Estou falando de ficar na miséria mesmo, de olhar para frente e não ver saída. Todos nós, né?

Qualquer pessoa comum, que tenha o mínimo de noção sobre a realidade, em algum momento parou e pensou: "E se não der nada certo? E se eu perder tudo?". Pois é, essa é a realidade da grande maioria da população, ainda mais se tu fazes parte da classe B e C e está sempre à beira do abismo, brigando para não cair mais um pouquinho.

Imagina então se tu foste criado em uma espécie de bolha, teus pais (ou responsáveis) trabalham, te garantem a maioria de tudo o que tu desejas, ouves pouquíssimos não, raros não pode e praticamente nenhum " isso é impossível", exato, tu fazes parte da Geração Z, tão discutida e rediscutida nos últimos anos em artigos e publicações, e de uma hora para outra tu te tornas adulto e precisas fazer por ti em um mundo cada vez mais competitivo, violento, digitalmente tóxico e nenhum pouco acolhedor.

Essa é a realidade que toda uma geração que entrou nos últimos anos no mercado de trabalho ou que entrará nos próximos e que representa mais ou menos 20% da população brasileira.

Eles já enfrentaram uma pandemia de largada, empresas quebraram, famílias foram destruídas e o mercado apertou ainda mais. Eles olharam nos olhos do futuro imediato e viram que a coisa não é molezinha, que nem tudo se decide com o cartão de crédito instalado no smartphone e que não existe começar o jogo de novo quando a última vida é perdida.

Essa geração saiu de um mundo de proteção excessiva, muitas vezes causada pela culpa dos pais que estavam trabalhando desesperadamente para poder dar exatamente esse mundo a eles, e caiu na realidade dura sem preparação para isso.

Agora tu estás lendo e pensando, "ah, mas quando eu saí de casa também foi difícil", claro que foi, todo mundo tropeça no início da estrada até aprender onde pisar, mas tinha uma diferença, a grande maioria das gerações anteriores sabia o que era o termo "esse mês não vai dar para comprar" e isso endurecia a casca, situava-te sobre prioridades, te mostrava o quanto era preciso brigar para conseguir as coisas, a Geração Z foi, ou vai, aprender direto na dor real.

E sabe porque eu to falando tudo isso? Não é para ser mais um crítico da Gen Z, até iro eles em várias coisas, mas para discutir com vocês sobre uma nova (ou talvez nem tão nova, apenas não discutida) fobia que muitos psicólogos têm trazido, a Penifobia.

Peniafobia é o medo irracional e persistente de ficar pobre ou de perder a segurança financeira. Mas não é aquele medo salutar, que todos devemos ter, de não gastar mais do que ganhamos ou de gastar tudo e não guardar nada, é um pânico real ao ponto de não querer gastar nada ou muitas vezes de ficar paralisado frente a vida por não se animar a fazer nada que possa colocar em risco, por menor que seja, a sua saúde financeira.

Segundo os psicólogos, um dos principais gatilhos para esse pânico é a indução das redes sociais. Sim, voltamos ao ponto tão discutido nos últimos anos, as redes sociais mais uma vez construindo mundos paralelos e alimentando fobias destrutivas.

Tu abres as suas redes e lá está: férias dos sonhos, roupas luxuosas, apartamentos impecáveis, sucesso profissional deslumbrante. Vidas perfeitas, atingidas rapidamente com muito talento, ideias geniais e algum esforço, mas nada que qualquer um não possa também se esforçar e atingir. No Insta ou no TikTok todo mundo pode, mas tu não és todo mundo. E esse sentimento de fracasso, misturado com urgência em virar o jogo e alimentado muitas vezes por coaches que te vendem fórmulas mágicas, vai criando um pânico e alimentando sentimentos de fracasso ou inferioridade.

A partir desses sentimentos, alguns jovens am a evitar gastar um único centavo, vivem em extrema contenção de despesas, desenvolvem problemas comportamentais, como ansiedade generalizada, distúrbios alimentares e até depressão.

Para os que mergulham mais fundo nesse pânico, ele assume a forma de uma verdadeira obsessão, acompanhada de pensamentos intrusivos ou distúrbios somáticos: dores de cabeça, fadiga crônica, palpitações. A sensação de urgência constante impede qualquer projeção calma no futuro, afinal, "está todo mundo dando certo, garantindo o seu futuro e eu aqui, perdido e correndo o risco de ficar miserável, preciso não gastar nada e juntar dinheiro para o meu grande lance, para a minha virada, que garantirá uma vida perfeita'. 

Só que a vida não funciona assim, a felicidade não está na linha de chegada, está na estrada, no dia a dia, na forma com que tu encaras os problemas, aceitas as dificuldades, abraças os bons momentos, usufrui do que tu podes. Quando a Giovanna Alvarenga me mandou o artigo falando em Peniafobia (termo que eu também não conhecia) e eu comecei a ler, fiquei pensando o quanto estamos errando sistematicamente com as novas gerações, como não conseguimos mostrar para eles que o dinheiro não é a razão da existência, mas sim uma das formas de tornar a nossa vida, e de quem nos cerca, mais tranquila.

Teremos ainda muita estrada pela frente até aprender a dosar essa necessidade de "ter", mas precisaremos aprender, porque é impossível evoluirmos como coletividade se não entendermos o real motivo de estarmos aqui.

Autor
Sócio-cofundador da Cuentos y Circo, Puhlmann é um dos principais especialistas em YouTube do país, com um olhar focado em possibilidades de faturamento na plataforma e uma larga experiência em relacionamento com grandes marcas do mercado de entretenimento. Além de diretor de Novos Negócios da CyC, tem também no seu currículo vários canais no país, entre eles o do escritor Augusto Cury, do Gov Eduardo Leite, Natália Beauty e do Grêmio FBPA, sempre atuando como responsável pela estratégia de crescimento orgânico dos canais. Já realizou palestras sobre a nova Comunicação juntamente com diretores do YouTube Brasil como a abertura do 28º SET Universitário da Famecos-PUCRS, o YouPIX/SP e o Workshop YouTube Gaming Porto Alegre. Desde 2013, Puhlmann ministra cursos, seminários e oficinas sobre YouTube, tendo mentorado mais de 30 canais nos últimos anos.

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