O Mestre-Sala dos bares

Até o início dos anos 40, Oscar Condor dos Andes Condessa habitou a Rua da Praia. Marujo de águas ardentes, navegava sobranceiro por todos …

Até o início dos anos 40, Oscar Condor dos Andes Condessa habitou a Rua da Praia. Marujo de águas ardentes, navegava sobranceiro por todos os bares, nos quais deixava frases de espírito e versos magoados.


Talvez o "Condor dos Andes" ele mesmo tivesse acrescentado ao nome para torná-lo pomposo. A mesma pompa com que festejava quem lhe pagasse o próximo trago: "Tropeçaste na minha simpatia e caíste dentro do meu coração". Ou como disse ao poeta Paulo de Gouvêa: "Deixas atrás de ti um rastro luminoso e um vago som de música flutuando."


O que ele próprio tinha deixado para trás, era enigma. Fazia versos para contar a tragédia pessoal, sem dizer se o álcool fora causa ou conseqüência: "Se ela voltasse outra vez sobre os seus os/  Refazendo de novo a nossa vida/ Eu lhe abriria eternamente os braços/ E outra ilusão viria, mais querida."


Como não deixou nada escrito, tudo se perdeu. As migalhas sobradas ficaram apenas na memória de circunstantes. O escritor Theodemiro Tostes guardou dois tercetos de um provável soneto: "Meu Deus, em cuja fé meu filho cresce / Meu Deus, em cujas mãos meu filho ponho / Dá-lhe confiança, dá-lhe ânimo e saúde // Que ele, na vida que ainda mal conhece, / Possa dar à vida a quanto foi meu sonho/ E ter o que eu quis ter e não pude".


O resto era irreverência, para fazer as pessoas rirem e convidá-lo ao próximo cálice.


Quando estourou a Revolução de 30, Condessa correu a se alistar voluntário, pondo no chapéu uma fita vermelha com a frase: "Tenho pena dos que ficam".


Não foi aceito, por  motivos óbvios. Para não magoá-lo ainda mais que a vida, disseram-lhe que não havia mais vagas. Que alguém tinha que guarnecer a retaguarda.


Conformado, mudou a frase da fita: "É preciso coragem para ficar".


 

Autor

Jayme Copstein é jornalista, com atividade em jornal e rádio desde 1943,com agens pelos principais veículos de Porto Alegre. Trabalhou 22 anos no Grupo RBS como apresentador de programas e comentarista de opinião da Rádio Gaúcha, e atualmente é colunista do jornal O Sul e apresentador do programa 'Paredão', na Rádio Pampa. Detentor de vários prêmios, entre eles, Medalha de Prata (2º lugar) no Festival Internacional do Rádio de Nova York (1995), em 1997 publicou "Notas Curiosas da Espécie Humana" (AGE). Seu livro mais recente é "A Ópera dos vivos", editado em janeiro de 2008.

Comments