O grande culpado

Finalmente vão acabar as piadas de que tudo no Brasil acaba em pizza: as investigações em Brasília já conseguiram apontar o grande culpado pela …

































Finalmente vão acabar as piadas de que tudo no Brasil acaba em pizza: as investigações em Brasília já conseguiram apontar o grande culpado pela vergonheira nacional. Talvez seja o último pedaço de pedaço que a impunidade nos sirva.
Antes de divulgar o perfil do maior responsável pelas irresponsabilidades políticas, cabe uma retrospectiva da capacidade desse líder nato: é ele quem, em todas as eleições, dá um jeito de influir e arranjar os quadros que vão compor a câmara e o senado.  Sua arte começa por saber agrupar nomes das siglas e depois induzir a formação de grupelhos dentro do Congresso. Ele é esperto, sábio e influente como ninguém. E escapa de todas as investigações.
Sua maior habilidade é garantir a manutenção dos quadros políticos, a preservação da imunidade parlamentar. Seu talento é tão grande que nem precisa mexer os pauzinhos. Apenas mexe os dedinhos, de 4 em 4 anos.
Assim, poderoso como só ele, garante a multiplicação dos sarneys e dos calheiros  pelos assentos das regalias, pelas fatias das mordomias, pelas vagas do nepotismo, pelas cifras das comissões por fora, pelas oportunidades oportunistas da corrupção. É uma fada-madrinha, que atende aos desejos da classe mais indesejada e repudiada do planeta. Como é possível que alguém consiga favorecer tanto mau-caráter, possibilitar tantas fraudes e falcatruas, tanto desvio de verbas?
Há muitos anos que as suspeitas o cercavam. Sobretudo por causa do seu papel na falta de renovação dos quadros políticos. É óbvio que existe um obstáculo, que impede que novos e honestos candidatos cheguem a ser eleitos. E mais óbvio ainda é o jeitinho que ele tem para reunir velhacos antigos e sabujos em formação nas mesmas legendas e daí promovê-los a membros da quadrilha que ele aquadrilhou e aparelhou para resistir a qualquer julgamento e punição.
Esse cúmplice de todos os crimes de abuso de poder, esse aliciador de gananciosos, esse facilitador do eterno corporativismo , esse fornecedor de recursos sem-fim e sem prestação de contas, esse distribuidor de diárias a rodo, esse agenciador de agens aéreas, esse provedor de altos salários e bônus disso e daquilo - esse cara tem um traço socialmente condenável: é um devotado da inclassificável classe política.
Sim, já adivinharam a identidade do grande culpado deste momento trágico que vivemos: é o eleitor. Ele nos meteu nessa situação sem saída. Cadeia com esse fdp!

O Outono, a mais outonal das estações, se alimenta de ouro e azul, um cardápio matinal servido na bandeja do céu. Antes, a alvorada cozinha rabos-de-galo no leste, em fogo mais que brando. Meio acordado, o horizonte se clareia para o seu desjejum de matizes. Uma toalha algodoada se estende por 180º, salpicada de detalhes ferrugentos. Completamente amanhecido, o Outono sai a ear pelo dia. Faceiro, é um flâneur elegante, cachecol de plátano ao vento, reverenciado por redemoinhos de cisco como se fossem cuscos. O Outono circula entonando canteiros, entoando viveiros, tão à toa quanto é possível para uma estação. Todo trajado de anil, segue rumo à tarde, deixando atrás de si a limpidez da época. Solitária na paisagem, uma pandorga engravata o peito enfunado do Outono, que já se ajeita, tingido de poesia, para se aninhar no poente. Esplendoroso, o Outono se despede de mais um dia, posando de pintura impressionista.

Autor
Fraga. Jornalista e humorista, editor de antologias e curador de exposições de humor. Colunista do jornal Extra Classe.

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