Nem rico nem pessimista, apenas um imbecil

                         A moral varia de sociedade para sociedade, a ética não.   

                         A moral varia de sociedade para sociedade, a ética não.



                                                        Bento Prado Jr.



Sábado, 27 de janeiro, fui surpreendido, no Jornal do Brasil, pelo escritor português José Saramago: "Estamos afundados na merda do mundo e não se pode ser otimista. O otimista é estúpido ou milionário e não se importa com o que ocorre no mundo ao redor".



O respeito que tenho pelo escritor e intelectual, um comunista que fez da  crença ideológica sua profissão de fé, faz-me acreditar que a declaração feita no lançamento da sua obra mais recente, As pequenas memórias, em Madri, não levava em conta a abrangência da frase e dos conceitos sobre pessimismo e otimismo. 



Prefiro acreditar que Saramago identificou a grande oportunidade para pôr a boca no trombone e declarar que um mundo onde poder, imperialismo,  etnias e religiões geram genocídios está na merda. E está mesmo. Vou mais longe: o mundo sempre esteve na merda. Quase sempre pelos mesmos motivos.



Quanto ao otimismo e seu antônimo, é como uma impressão digital, cada um tem uma postura muito individual. 



Tenho absoluta certeza de que, fora o acidental, é muito difícil encontrar tragédias ou epopéias não geradas pelo otimismo. Alguém acredita que Hitler não fosse otimista quanto ao futuro do nazismo e da Alemanha?



Gosto muito de uma lei de Murphy que sentencia que se você acha que não vai dar certo, já não deu.



O que me incomodou na declaração do Saramago é que sempre faço absoluta distinção entre o cidadão e seu compromisso ético com o mundo e a pessoa em busca de seu bem-estar pessoal.



A quase totalidade dos indivíduos nasce sem a possibilidade de interagir nos destinos do planeta. Não é a toda hora que surge uma Joana D"Arc ouvindo vozes do Arcanjo Miguel e das santas Catarina e Margarida, assim como é fato único um ex-operário inculto ser presidente de um país como o Brasil sem haver deixado de ser inculto.



Sou otimista de berço em relação ao meu universo pessoal e, inda que  muito pouco, tudo o que consegui fazer foi gerado pelo otimismo. Mesmo alguns fragmentos dos sonhos não realizados levaram a muitas conquistas.



Saramago tem afirmado com o seu talento e o seu trabalho a possibilidade de um indivíduo melhor. Com o seu talento e com seus livros, tenta mudar alguma coisa, inda que não queira ser confundido com um otimista imbecil. Creio que sua porção otimista é que gera sua energia.



O mundo sempre foi e é uma merda, o Brasil mais ainda e este escriba não-rico agrava a sua condição de otimista sendo feliz.



Sou, além de otimista, um imbecil feliz.



Muito feliz.



Inté.



 


Autor
Mario de Almeida é jornalista, publicitário e escritor.

Comments