Livros de artista

O nome dela é Kátia Prates. Artista e designer, produziu o pressbook do filme O homem que copiava, de Jorge Furtado. No livro, usou …

O nome dela é Kátia Prates. Artista e designer, produziu o pressbook do filme O homem que copiava, de Jorge Furtado. No livro, usou a fotocópia como forte base da linguagem e, no cantinho de algumas páginas, colou flips que reproduzem seqüências no folhear rapidinho.


Kátia  falou a estudantes e designers sobre seu trabalho e revelou inspiração na mistura das imagens sobrepostas, característica retirada do personagem do ator Lázaro Ramos, que via muitas coisas e, por ser um xerocopiador, não conseguia ir até o fim do que lia. Assim, a mistura da mistura que se transforma em outra coisa está presente nos grafismos utilizados por Kátia na construção do livro.


Quem vê o filme - e, em geral, o faz apenas uma vez - não percebe todas as nuances que são detalhadamente estudadas no momento em que se constrói uma cena. Um elemento visual, por exemplo, que chama a atenção do personagem vivido por Pedro Cardoso se repete em outro momento quando ele vê o mesmo elemento na gravata de um outro sujeito. No filme, essas cenas duram apenas segundos, mas no livro (pressbook) desenhado por Kátia, isso vai durar para sempre, isto é, enquanto circular a tiragem dirigida de 2 mil livros, gerada apenas para fomentar os negócios da Casa de Cinema de Porto Alegre. No entanto, esse livro na mão de cinéfilos iria fazer o maior sucesso. Fica a dica da editora Fu Lana para a reimpressão da obra atemporal, desta vez visando aos pobres consumidores.


Fu Lana estava na platéia da palestrante. Ficou embatucada com a versão "suja" do livro e com a "não tão suja" visão cinematográfica de Jorge Furtado. Arriscou a pergunta e segurou no peito a resposta: "Têm coisas no filme que tu nem sabes, mas estavam lá". É a informação submersa. A marca do trabalho de Kátia é dar o máximo valor a uma idéia e à sua construção, então o livro é a visão dela, detalhada mesmo, sobre o filme, que acompanhou de perto, até porque produziu a maior parte dos objetos em papel usados nele.


A fotocópia e a sobreposição são as fortes presenças, assim como a projeção do dobro do espaço de texto para a utilização de imagens e grafismos. Ela pensou isso logo de cara, para projetar livre e amplamente sua linguagem visual. Não se preocupou muito com a legibilidade dos textos, pois a obra foi destinada a um público interessado e descolado, com muita quilometragem no consumo audiovisual.


Kátia fez um curso de especialização em Arte e Tecnologia em Chicago, nos Estados Unidos, e isso fez com que a metalinguagem fosse seu calcanhar de Aquiles. Nada a pelas mãos dela sem que tenha sido bem pensado em diversas instâncias. Muito pensa e imagina desde o briefing do cliente, ou seja, do que o cliente necessita (no caso, uma publicação impressa sobre um filme de longa-metragem) até a produção de um livro que não seja muito grande, tenha um formato que lembre a telona na proporção horizontal, tenha cores desbotadas como uma fotocópia, traga muita mistura e sobreposição, seja contemporâneo e instigante e cumpra uma função de produto editorial a longo prazo. "É importante descobrir a personalidade do objeto e o que ele tem a revelar." Fu Lana anotou.


A dica da experiente designer é ter sempre como aliado um bom gráfico. Não basta uma boa gráfica, mas também é importante contar, e muito, com aquele cara que fica em frente a uma linha de botões da máquina impressora e que ele tenha sempre o maior interesse em arrancar daquele equipamento o seu melhor trabalho.


Na palestra, que faz parte de um ciclo da Escola de Design da Unisinos, todas as quartas-feiras (benditas quartas-feiras), com entrada gratuita e aberta ao público, Kátia apresentou também o livro Premonitor, que, na verdade, é muito mais do que um livro. É uma obra de arte coletiva.


Vencedor em uma edição do Fumproarte, ação da Prefeitura de Porto Alegre para o incentivo das artes, Premonitor é um projeto que propôs a reunião de artistas contemporâneos mais significativos do Estado do Rio Grande do Sul para desenvolverem um trabalho específico visando à impressão em um livro. Eles tiveram o espaço de quatro páginas cada um e puderam, inclusive, entregar as páginas já desenhadas, prontas, para o processo CMYK (processo off-set de impressão em linha industrial).


Este livro de artista (que só não teve essa denominação por não ter numeração um a um, como uma obra única de arte) foi lançado no Museu Ado Malagoli (Margs), com a exposição da própria obra em vitrininhas de acrílico, onde não estavam os trabalhos, pois a verdadeira obra era o livro.


Posições como esta, em relação à valorização de um produto que se utiliza de uma específica tecnologia para existir, são o que torna diferente o trabalho de Kátia, requisitado freqüentemente pelas grandes agências do Estado. Afinal, o diferente é o que vende.


Um pouco de suas idéias fica aqui registrado por Fu Lana:


"Os catálogos de exposição reproduzem mal e porcamente aquilo que foi maravilhosamente exposto. Nós queríamos fazer mais. A reprodução de algo que se utiliza da tecnologia deve trazer uma contribuição para o outro e que não seja apenas mais uma coisa que pode ser feita, mas que possa mover, mudar, somar e ter um real significado. Interagir não quer apenas dizer uma resposta ao movimento do mouse. É muito mais do que isso".


Fu Lana amou o raciocínio, a palestra, os produtos. Estava de bom-humor, aprendeu algo e agora recomenda.

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