In forma (12/02/25)
Por Marino Boeira

A POLÍTICA E A GUERRA
O que é uma qualidade nas relações interpessoais - o respeito às opiniões dos outros, a tolerância e a capacidade de encontrar o meio termo que agrada os dois lados - pode ser um grave defeito na política.
A razão é simples: a política em sua síntese final é uma disputa entre posições inconciliáveis, onde cada grupo representa interesses objetivos opostos e todas as tentativas de acordo se transformam sempre em fracassos.
O caso mais representativo desse modelo é o chamado Pacto de Munique de 1938. Os interesses do grande capitalismo naquela época eram representados por duas potências européias com interesses econômicos antagônicos - Inglaterra e Alemanha. De lado Hitler e seus aliados nazistas e de outro Lord Chamberlain e as chamadas democracias ocidentais. Quando retornou a Londres com um documento onde Hitler assegurava não ter reivindicações territoriais a Leste d Europa, Chamberlain afirmou enfaticamente que ele era a garantia de uma paz duradoura para o mundo. Pouco tempo depois, Hitler ordenou a invasão da Polônia.
Simon Bolivar, Lenin, Mao e Fidel Castro são exemplos clássicos de políticos que souberam ver que existem momentos em que a ruptura é o único caminho e foram vitoriosos em seus tempos.
O prussiano Carl Von Clausewitz teorizou sobre isso dizendo que "a guerra era a continuação da política por outros meios".
Essa afirmação pode ser lida também com uma inversão dos seus termos para manter o conceito: a política é uma guerra com outros meios. Em vez de canhões e granadas, os discursos e os acordos, mas sempre levando em conta que na vida política, cada palavra, cada gesto representa os interesses de um grupo.
Para exemplificar, vamos tomar o caso do Brasil. Temos um país dividido em dois grandes segmentos de interesses opostos: de um lado a classe dominante representada por empresários, banqueiros, latifundiários, a elite militar, a grande mídia e as igrejas, toda ela protegida pelo escudo do Imperialismo norte-americano; de outro, o povo, em grande parte alienado de seus direitos históricos.
No meio dessa disputa, um político que no ado se disse representante dos trabalhadores, Lula da Silva, mas que hoje obedece a todos os ditames das elites econômicas, tenta estabelecer um acordo impossível entre os interesses opostos desses grupos.
Se alguém ainda tivesse alguma dúvida sobre qual é sua posição, bastaria ter acompanhado essa semana a entrevista do seu ministro da Defesa, José Múcio Monteiro Filho no programa Roda Viva.
Todas as teses da direita foram expressas com clareza e sem quaisquer vacilações pelo ministro, inclusive a de que as Forças Armadas exercem por direito o chamado Poder Moderador no Brasil. Na esteira dessa definição, por conseqüência, Múcio defende o esquecimento da ditadura militar, o direito dos militares aos benefícios que os demais servidores não tem, se permitindo até uma citação de Voltaire - "Não concordo com que dizes, mas defendo o teu direito de dizer - para justificar os acontecimentos de 8 de janeiro.
Entre todos os compromissos que Lula e seu partido teriam a obrigação histórica de cumprir, um dos fundamentais era a consolidação da democracia que implica na ruptura clara e definitiva com a ordem militar. Não é o que acontece. Lula já pediu para deixar de "remoer o ado" e José Múcio se apresenta claramente os interesses dos militares junto ao governo e não o contrário, o de representante do governo junto aos militares.
De Neville Chamberlain (1869/1940) a Luiz Inácio Lula da Silva (1945...) os acordos entre inimigos nunca foram cumpridos.