IN FORMA
Por Marino Boeira

UM PAÍS SEM MEMÓRIA
Uma forma de manter o atraso cultural em que vivemos é pensar que tudo começa hoje. O movimento sindical no Brasil nasceu com o PT em São Paulo; os brasileiros nunca se revoltaram contra seus governos e o ado é uma roupa velha que não nos serve mais como cantou Belchior e por isso deve ser esquecido.
Quando o próprio presidente Lula diz que não se deve remoer o ado, isso é um sinal de que existem interesses muito grandes querendo apagar a memória do povo.
Agentes ativos da ditadura militar que prenderam, torturaram e mataram durante anos continuam impunes. O titulo do livro de Flávio Tavares, "Memórias do Esquecimento" sobre essa época diz tudo: ele como vítima do que aconteceu, lembra dos fatos, mas seus carrascos que nunca pagaram pelo que fizeram, já se esqueceram deles.
Há cem anos, a serem completados no próximo dia 28 de outubro, um movimento militar abalou o Brasil, a Coluna Prestes. A não ser em algum programas de canais alternativos no YouTube, pouco se falou do acontecimento, mesmo que ele tenha sido o responsável pelo abalo final na República Velha e o primeiro o para a sua queda em 1930.
Quando não trata de esquecer a Coluna Prestes, a classe dominante através dos seus prepostos na mídia, busca denegrir a imagem de Prestes e seus comandados. Um dos exemplos disso é a série de reportagens que a jornalista Eliane Brum, então em Zero Hora, publicou em 1994 sob o título de O Inverso da Lenda, posteriormente transformada em livro.
Lembro que na época, eu como diretor da rádio FM Cultura promovi um debate da jornalista com os historiadores Mario Maestri e Luis Roberto Lopez, quando a fragilidade dos argumentos dela a respeito de possíveis violências dos participantes da Coluna, foram destruídos.
Quem tem se encarregado, como convidada em alguns programas de TV a falar sobre a Coluna Prestes, tem sido a historiadora Anita Leocádia Prestes, filha do líder da Coluna, Luis Carlos Prestes. Anita é também uma figura histórica na vida brasileira. Filha de Prestes com Olga Benário, nasceu num campo de concentração na Alemanha e viveu muitos anos no exterior antes de se transformar na maior divulgadora da memória do seu pai.
Sua tese de doutorado na Universidade Federal Fluminense sobre a Coluna Prestes foi transformada em livro, reeditado esse ano pela Boitempo como mais um registro da Coluna.
Embora em 1924, quando iniciou sua marcha invicta pelo Brasil até ingressar na Bolívia, Prestes e seus liderados lutassem por causas liberais, principalmente pelo voto secreto, o contato com a imensa pobreza no interior do País, foi o que levou seu dirigente maior a perceber que o problema do Brasil era muito maior.
A Coluna é o marco da virada de Prestes, até então mais um tenente envolvido na luta contra os governos oligárquicos do País, em um revolucionário que enxergou que as lutas seguintes deveriam ser contra o capitalismo brasileiro, subserviente do imperialismo norte-americano.
É esse momento que vamos comemorar na próxima segunda feira quando lembrarmos o centenário da Coluna Prestes.