IN FORMA

Por Marino Boeira

O novo mundo

O encontro Putin e Xi Jin Ping em Moscou, esse mês, assinalou simbolicamente o fim da geopolítica que dominou o mundo desde o final da Segunda Guerra Mundial sob o poder hegemônico dos Estados Unidos e anunciou o início de uma nova era onde esse poder será disputado entre dois grandes blocos: os Estados Unidos e seus aliados da OTAN, em franca decadência econômica e o que inclui a China, a Rússia e o Irã, em acelerado crescimento econômico.

Antes mesmo do fim da Segunda Guerra, as conferências de Casablanca (1943), do Cairo (1943); Teerã (1943) e principalmente Yalta (1945) começaram a desenhar o novo mundo que surgia. Isso seria consolidado, logo após o fim da guerra, entre julho e agosto de 1945, em um novo encontro dos líderes da União Soviética, Estados Unidos e Grã-Bretanha, dessa vez em Potsdam, simbolicamente em território da Alemanha derrotada. Nessa ocasião ficou decidido que uma nova Alemanha unificada e democrática só surgiria depois de um processo de desmilitarização e desnazificação. Ao mesmo tempo as potências ocidentais aceitavam a consolidação da influência da URSS sobre o Leste Europeu, como um reconhecimento da importância fundamental do Exército Vermelho para a derrota do nazismo.

Nada disso foi cumprido pelos Estados Unidos e seus aliados, que logo boicotaram o processo de democratização alemã, com a criação da República Federal Alemã e os pesados investimentos financeiros na sua recuperação econômica, ao mesmo tempo em que iniciavam um longo processo de desgaste, primeiro da União Soviética e depois da Rússia, completado com uso militar da Ucrânia como instrumento de ataque às populações russófilas do Donbass e Lugansk.

Durante os últimos 75 anos, com algumas derrotas políticas (o surgimento da China Popular) e outras militares (Coréia, Vietnam, Cuba) e algumas vitórias (principalmente o esfacelamento da URSS) os Estados Unidos criaram um mundo unipolar, mantido principalmente por um controle total dos grandes meios de Comunicação, mas que não dispensou guerras localizadas (Iraque, Líbia, Afeganistão).

As contradições do modo capitalista de produção e a resistência de muitos países em aceitar o papel que lhe foi imposto pelos Estados Unidos, geraram o surgimento de novos centros de atração política, principalmente com o extraordinário crescimento da China e a recuperação econômica da Rússia nos governos de Putin.

No caso chinês, a melhor maneira para nós brasileiros conhecermos o que ocorreu por lá é a leitura do livro do professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Elias Jabbour - China - O Socialismo do Século XXI.

A aproximação entre China e Rússia, países que dispõem de um potencial econômico extraordinário, começou a funcionar como um polo de atração para outras nações na Ásia, África e Oriente Médio, incluindo Irã, Índia, África do Sul e possivelmente a Arábia Saudita.

Em recente artigo, o professor José Maria Fiori, analisa essas grandes mudanças na geopolítica mundial, vendo nelas, principalmente a derrota final dos Estados Unidos: "Na década de 1950, os Estados Unidos construíram seu esquema de poder no Oriente Médio apoiado no Irã, na Arábia Saudita e em Israel. Em 1979, os norte-americanos perderam o Irã, e agora estão perdendo a Arábia Saudita".

O professor Fiori se refere ao dia 15 de março de 2023, em Pequim, quando foi anunciado um acordo mediado pela China de pacificação das relações entre o Irã e a Arábia Saudita, e do restabelecimento de relações diplomáticas entre os dois países em dois meses mais, junto com seu compromisso mútuo de defesa do princípio da soberania nacional A isso se soma ao Plano de Paz de 12 pontos para a Ucrânia, apresentado pela China aos governos da Rússia e da Ucrânia, e também aos governos dos demais países envolvidos diretamente nessa guerra, a começar pelos Estados Unidos

Se na Europa e na Ásia a influência americana parece estar chegando ao fim, infelizmente, nós brasileiros e latino-americanos, devemos esperar uma pressão cada vez maior do imperialismo americano, por sermos a última grande reserva econômica que resta para eles. Caberá a nós a tarefa revolucionária de finalmente conquistarmos a nossa independência econômica.

Autor
Formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), foi jornalista nos veículos Última Hora, Revista Manchete, Jornal do Comércio e TV Piratini. Como publicitário, atuou nas agências Standard, Marca, Módulo, MPM e Símbolo. Acumula ainda experiência como professor universitário na área de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos). É autor dos livros 'Raul', 'Crime na Madrugada', 'De Quatro', 'Tudo que Você NÃO Deve Fazer para Ganhar Dinheiro na Propaganda', 'Tudo Começou em 1964', 'Brizola e Eu' e 'Aconteceu em...', que traz crônicas de viagens, publicadas originalmente em Coletiva.net. E-mail para contato: [email protected]

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