Hortelino tloca-letla

Há algum tempo, recebi um texto solicitado a uma candidata a estágio em jornalismo. A menina tinha (e tem) o que se chama "atitude" …

Há algum tempo, recebi um texto solicitado a uma candidata a estágio em jornalismo. A menina tinha (e tem) o que se chama "atitude" e na entrevista olho no olho se mostrou muito competente, cheia de sugestões e soluções para um bom trabalho de divulgação. Quando o texto, que era uma avaliação sobre um site, chegou, a realidade se revelou na primeira linha: "espero que vocês entendão a avaliação", dizia a moça. E seguia-se um interminável tratado de semiologia sobre uso da internet e comunicação.


Este descomo entre o conteúdo que os acadêmicos de comunicação estão absorvendo e tentando decifrar e a capacidade de se expressar por escrito com a mínima correção possível é preocupante. Em especial porque isso está se tornando regra.


Quem está acostumado a trabalhar com estagiários sabe que existe uma ansiedade enorme de parte deles no que toca a entrar no mercado de trabalho e adquirir uma experiência capaz de garantir empregos futuros. Em geral, quem faz estágio engrena no trabalho tentando mostrar serviço: iniciativa, capacidade de ar estresse, competência. E todo mundo sabe o quanto é difícil coordenar a vida com uma carga de horas/aula cansativa e mais seis ou oito horas de estágio.


Por sua vez, quem contrata nem sempre tem tempo ou paciência para ensinar o beabá (que, é claro, já deveria ser lição ensinada e aprendida desde o ensino fundamental) e dá preferência para os que já se mostram mais "prontos". Azar, então, de quem foi vítima, com toda certeza, dos métodos Piaget interpretados pelos mestres das Organizações Tabajara do ensino: vai continuar escrevendo errado o resto da vida se não achar um tutor profissional que se proponha a endireitar o que se criou torto. E, pior ainda: se encontrar um editor sobrecarregado que corrija seus textos dia após dia, ainda é capaz de se consagrar assinando matérias que lhe darão, inclusive, premiações.


Mas não dá para crucificar (só) os estagiários: as bancas de revistas estão entupidas de títulos, novos e antigos. Muita coisa realmente ruim, mal editorada, mal editada, picaretagem pura. É só folhear e descartar.


O problema é quando assassinam a língua portuguesa em publicações consagradas. Quem leu Isto É dinheiro da semana anterior, viu, no olho de uma matéria sobre a Varig, em corpo bem grande, a palavra Erdou. Na esperança de que tivessem se dado conta do mal-feito, fui ao site: está lá, como legenda, abaixo da foto de Ruben Berta. Sem h. Isso é que é errar com convicção. 

Autor

Jornalista formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Maristela Bairros já atuou como redatora, repórter, editora e crítica de teatro nos principais diários de Porto Alegre, colaboradora de revistas do Centro do País e foi produtora e apresentadora nas rádios Gaúcha, Guaíba AM, Guaíba FM e Rádio da Universidade, assessora de imprensa da Secretaria de Estado da Cultura e da Fundação Cultural Piratini. É autora de dois livros: Paris para Quem Não Fala Francês e Chutando o Balde, o Livro dos Desaforos, ambos editados pela Artes & Ofícios.

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