Fatih, fatídico

Fu Lana não viu Contra a parede, filme de Fatih Akin, premiado com o Urso de Ouro em Berlim/2003, mas a partir de Do …

Fu Lana não viu Contra a parede, filme de Fatih Akin, premiado com o Urso de Ouro em Berlim/2003, mas a partir de Do outro lado, devorou (em DVD) o divertido conto de fadas Do outro lado das férias e Atravessando a ponte, um documentário sobre a música produzida em Istambul.


A proposta de Fatih é clara. Filho de pais turcos, ele faz parte da chamada segunda geração na Alemanha, marcada pela ambivalência cultural. Criado em Hamburgo, representa, hoje, o premiado cinema alemão. Dessa mistura, e da ligação Ocidente/Oriente que acompanha historicamente a cidade de Istambul, Fatih está produzindo o que chama de trilogia: amor, morte, diabo.


O mundo poderia receber o trabalho do diretor como uma proposta de planeta único. Pessoas de um lado e de outro deixariam de demarcar as diferenças. A cidade, em dois continentes, Europa e Ásia, dividida por uma ponte, é o ponto de contato entre duas das muitas faces do mundo. Nos filmes de Fatih, encontros e desencontros são os filhos do acaso com a coincidência. Pontuadas por humores em altos e baixos, as pessoas mudam de idéia, mudam de lado, e a sensação de ir e voltar, física e psicologicamente, é permanente. O trabalho dá uma sensação de arrependimento. O que a gente fez e não deveria; o que deixamos de fazer e teria sido fundamental.


Do outro lado nos deixa enredados num emaranhado de histórias, pessoais e universais, nem sempre agradáveis e das quais não se pode fugir. Uma relação de sensações opostas pode ser levantada a partir da dualidade geográfica. Em Do outro lado das férias, as estranhíssimas histórias dos personagens se entrelaçam igualmente, porém o perfil lúdico e juvenil do filme alivia a carga dramática existente nos outros filmes de Fatih. Identificamos a mesma presença de uma corrente de fatos que modifica os caminhos definidos pelos personagens, como se estivéssemos em um rio, sendo levados pelo destino, à mercê do que pode ar por ele, para o bem e para o mal.


Os valores morais, para Fatih Akin, não são estanques. Não existem o certo e o errado. Tudo depende de que margem você está, de tudo à sua volta, de quem o cerca, de suas intenções. Por isso, Fu Lana sentiu-se mareada, indo e vindo, sem parâmetros préconcebidos nos quais poderia se fixar. Levada pela correnteza, ansiava por atravessar a ponte de volta ao confortável e seguro mundo das regrinhas culturais às quais está acostumada. Dentro dela, porém, as mudanças começaram a acontecer. O mundo, em um movimento inevitável, ruma direto à fusão total, onde a multiplicidade é a regra e o convívio é perfeitamente possível. Jura.

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