Falo com...
Por Marino Boeira


Falo com o General Flores da Cunha - militar e político - 1880 - 1959.
General Flores, o senhor ficou famoso no folclore político do Rio Grande do Sul principalmente pelos seus comentários nas mais diversas ocasiões. Em vez de lhe fazer perguntas, vou lembrar inicialmente algumas de suas histórias e o senhor apenas diz se foram verdadeiras ou inventadas pelos seus adversários.
O senhor participava de uma cerimônia em sua homenagem em Uruguaiana, quando o acadêmico de direito, Mirandolino Comaru, começou a ressaltar suas qualidades - "Bravo general Flores, corpo de espartano, cérebro ateniense, coração de pomba e alma de dama". Preocupado com o que ele iria ainda falar, o senhor chamou o organizador do evento e pediu: "Tira daqui esse demente, antes que me chame de fresco".
"Verdade."
As outras duas histórias são relacionadas com o carteado no Clube dos Caçadores, do qual o senhor era frequentador habitual. Na primeira, o senhor está numa mesa de pôquer e recebe de mão um four de damas. Às suas costas, um puxa-saco não consegue se conter e sorri pra todo mundo. Imível, o senhor dispensa o four e pede outras quatro cartas. O puxa-saco não consegue conter seu espanto e larga um "oh!!!". Então o senhor volta-se para ele e fala: "Sofre peru filho da puta".
"Verdade."
Mas a melhor, General, dessas histórias é a noite em que um paulista aparece para jogar e vai ganhando todas as mesas. Numa rodada final, com todas as fichas na mesa, o paulista aposta tudo e o senhor não só aceita como dobra a parada. Postas as cartas na mesa, o senhor tem apenas cinco cartas diferentes que não formam nenhum jogo. O paulista já vem recolhendo todas as fichas, quando o senhor o interrompe e se trava esse diálogo.
- Que é isso, General? Cachorrão?
- Que é isso, eu é que pergunto? Ganhei a mão.
- Mas, como General?
O senhor, então calmamente, lhe explica:
"Aqui no Rio Grande, cinco cartas, uma diferente da outra, chamamos de Farroupilha. É o jogo mais alto."
O jogo então prossegue, com o paulista conformado com a nova regra. Mais um pouco e o paulista põe na mesa suas cinco cartas, todas diferentes e já avança sobre as fichas, quando é interrompido pelo senhor.
"Não, seu moço. Esse jogo, o Farroupilha, é tão importante que só é permitido um por noite."
"Verdade."
Há uma outra história que o senhor precisa confirmar. Um bandido que assaltara uma loja na Rua da Praia, foge subindo a Rua da Ladeira, perseguido por vários policiais, acaba entrando no Palácio Piratini, onde enfrenta os policiais da guarda pessoal do Governador, conseguindo desarmá-los. Alertado pela confusão, o senhor desce as escadas do palácio de arma em punho e domina o ladrão. Só que, em vez de entregá-lo à polícia, o senhor o contrata para sua guarda pessoal, dizendo que alguém que conseguia desarmar os policiais da sua guarda pessoal deveria ficar ao seu lado.
"Verdade."
General, para encerrar vamos lhe fazer apenas duas perguntas. O que o senhor pensa de um político que perdeu as eleições?
"Político sem mandato é como mulher da vida, sem cama."
Uma última, General. Depois de ter desempenhado alguns dos mais importantes cargos no Rio Grande e no Brasil, o senhor viveu sua velhice com poucas posses, o que lhe aconteceu?
"Cavalos lerdos e mulheres ligeiras."
Nos seus últimos dias de vida, o que o senhor pediu?
"Quero morrer no Rio Grande olhando as suas coxilhas."