Falo com...

Por Marino Boeira

Falo com Darcy Ribeiro - 1922/ 1997 - Antropólogo, sociólogo, historiador, escritor e político.
- Darcy, se você, que foi uma das figuras mais importantes na vida política e cultural do Brasil, tivesse que fazer um balanço de sua trajetória, o que diria?
- "Fracassei em tudo o que tentei na vida.
Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.
Tentei salvar os índios, não consegui.
Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.
Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.
Mas os fracassos são minhas vitórias.
Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu."
- Quais são as opções de vida para as pessoas?
"Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca."
- Como você vê o Brasil?
- "O Brasil, último país a acabar com a escravidão tem uma perversidade intrínseca na sua herança, que torna a nossa classe dominante enferma de desigualdade, de descaso".
- Você, Darcy, como o criador da Universidade de Brasília, o que pensa da Academia?
- "Mestrado é só para mostrar que o sujeito é alfabetizado, pois a metade dos que estão na universidade não sabem ler."
- E a sua agem pelo Partido Comunista?
- "De certa forma, o Partido Comunista fazia de cada membro um herdeiro responsável pelo destino humano. Então é uma atitude que faz com que você seja capaz de comover-se com o que acontece de ruim na guerra, ou de bom em alguma outra coisa, em qualquer lugar da Terra. Você é responsável pela humanidade."
- E por que você saiu do Partidão?
- "Naquele tempo, aos 24 ou 25 anos, eu continuava comunista ativo, queria muito ser comunista profissional e fiz contatos para isso. Foi então que o Joaquim da Câmara Ferreira, diretor do Jornal Hoje, prestes a ar um ano em Moscou, propôs que eu ficasse dirigindo o jornal do Partido. Diante disso, o Partido Comunista teve que tomar uma decisão, e, tendo mais juízo do que eu, avaliou que era loucura me entregar o jornal, como também era loucura me integrar como um quadro profissional. Então, disseram-me que tinham vários nomes sérios como Oscar Niemayer e como Portinari; que precisavam criar sábios para o futuro e que eu estava liberado. Então eu sou um caso estranho de liberação, eu não sou renegado, nem fugido, nem nada, fui licenciado pelo Partido Comunista para ser cientista. Para mim, foi uma decepção aquilo."
- Você conviveu com praticamente todos os políticos de sua época. Qual deles mais o impressionou?
- "Brizola é o maior estadista desse país. Esse homem, que percebeu a importância da educação, vai fazer uma revolução. Nós começamos a fazer a revolução e vamos continuar fazendo essa revolução educacional"
- Finalmente, Darcy, e a morte?
-"Eu não tenho medo da morte. A morte é apagar-se, como apagar a luz. Presente, ado e futuro? Tolice. Não existem. A vida vai se construindo e destruindo. O que vai ficando para trás com o ado é a morte. O que está vivo vai adiante".

Autor
Formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), foi jornalista nos veículos Última Hora, Revista Manchete, Jornal do Comércio e TV Piratini. Como publicitário, atuou nas agências Standard, Marca, Módulo, MPM e Símbolo. Acumula ainda experiência como professor universitário na área de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos). É autor dos livros 'Raul', 'Crime na Madrugada', 'De Quatro', 'Tudo que Você NÃO Deve Fazer para Ganhar Dinheiro na Propaganda', 'Tudo Começou em 1964', 'Brizola e Eu' e 'Aconteceu em...', que traz crônicas de viagens, publicadas originalmente em Coletiva.net. E-mail para contato: [email protected]

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