Falo com...
Por Marino Boeira

Falo com Manoel Francisco dos Santos - Mané Garrincha - 1933/1983
Garrincha, sei que você sempre teve muitas dificuldades para se expressar, então vamos começar citando o que algumas pessoas diziam a seu respeito, como jogador de futebol, começando pelo nosso poeta maior, Carlos Drummond de Andrade.
-"Se há um deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irônico e farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios."
Armando Nogueira, jornalista e escritor, exaltou a sua capacidade de driblar em pequenos espaços.
-"Para Mané Garrincha, o espaço de um pequeno guardanapo era um enorme latifúndio."
Já Nelson Rodrigues, como sempre, foi dramático na avaliação que fez de ti.
-"Um Garrincha transcende todos os padrões de julgamento. Estou certo de que o próprio Juízo Final há de sentir-se incompetente para opinar sobre o nosso Mané."
Você ficou famoso no mundo inteiro em 1958, naquele jogo contra a União Soviética, pela Copa do Mundo, quando enlouqueceu os zagueiros russos. Seu companheiro de time, o Didi, comentou o que aconteceu.
-"Eu fazia o lançamento e tinha vontade de rir. O Mané ia ando e deixando os homens de bunda no chão. Em fila, disciplinadamente."
Aliás essa história de infernizar os laterais encarregados de marcá-lo começou no Botafogo quando do seu primeiro treino. O Nilton Santos contou o que aconteceu.
-"Ele me deu um baile. Pedi que o contratassem e o pusessem entre os titulares. Eu não queria enfrentá-lo de novo."
O mesmo Nilton Santos sobre quem foram suas vítimas naquela copa de 58.
-"Eles começaram marcando no mano a mano. Tsarev contra Garrincha. De repente, aram a amontoar vários outros naquele lado esquerdo do campo. Era hilariante o desmanche que Mané fazia por ali."
Um episódio nesse jogo contra a URSS foi comentado. O treinador Vicente Feola lhe explicou didaticamente, o que você deveria fazer quando fosse marcado e você respondeu: "o senhor já combinou isso com os russos?"
O Nilton Santos dizia que às vezes nem sabia contra quem estava jogando. O Didi lembrou um comentário seu antes de um jogo com a Inglaterra, na outra Copa, em 62 no Chile.
-"Você viu, Didi? O São Cristóvão está de uniforme novo!"
Depois dos russos, foi a vez dos suecos ficarem amedrontados contigo em 58.
-"Estávamos em pânico pensando no que Garrincha poderia fazer. Não existia marcador no mundo capaz de neutralizá-lo."
Nils Liedholm, meia da Suécia na Copa de 58.
O jornal inglês Daily Mirror foi definitivo depois da Copa do Mundo de 1958.
-"Em cinquenta anos de futebol jamais apareceu um jogador como Garrincha."
Para encerrar, Garrincha, algumas coisas que eu gostaria de te perguntar.
- O que você acha de ter jogado duas Copas do Mundo?
- "Campeonatinho mixuruca. Não tem nem segundo turno!"
No final da Copa da Suécia ficou famosa a foto dos jogadores brasileiros abraçados e chorando. Por que você ficou sério?
- "Mas por que todo mundo está chorando? Não ganhamos o jogo?"
Finalmente, Mané Garrincha, como foi aquela história na Copa do Chile em 62 que você fez um gol com a perna esquerda, que você praticamente nunca usava?
- "A bola veio para a esquerda e eu não chuto bem de esquerda, mas não dava pra trocar de pé. Então chutei de esquerda fazendo de conta que era de direita."
