Esperança numa sexta amena
Dia de botar salto alto e bico fino, nesta fase da vida, é dia especial, embora nem sempre confortável para quem operou um menisco …
Dia de botar salto alto e bico fino, nesta fase da vida, é dia especial, embora nem sempre confortável para quem operou um menisco - ficaram para trás, nos anos 70, os tamancos usados com saia e top de patchwork na então bacanérrima loja Falk's. Mas este dia 2 de dezembro, noblesse oblige, teve figurino mais ajeitado, um make up básico e um pouco de tensão que, segundo meu amigo Nelson Mola Ferrão, é muito bom para a cabeça e a produtividade - ele dizia isso quando era editor-geral de O Sul e eu tinha vontade de esgoelá-lo. Hoje, sei que tem razão - sem tensão, só relax não faz com que as coisas andem como devem andar e a tendência é cair no slow motion.
Pois a ocasião para tanto cuidado com a aparência foi a , no Café Santo de Casa, no sétimo andar da Casa de Cultura Mario Quintana, do termo de parceria entre o Governo do Estado (via Secretaria Municipal de Cultura), o Banrisul e a Associação dos Amigos da CCMQ, presidida pelo Eduardo Vital. Coisa protocolar, claro, já que envolve oficialidade e autoridades, mas bem agradável, por várias razões: o dia esplêndido, com uma brisa amigável, um cardápio que envolveu os petiscos que o poeta apreciava (tudo preparado pela cozinha do Piratini, orgulho ao longo de vários governos), a champanhota gelada no ponto e gente legal em volta. Mais legal ainda quando faz tempo que não vemos alguém e ganhamos abraços apertados, aquela frase que soa como uma berceuse na alma: "que saudades!!!", mesmo que o papo seja apressado e as promessas de se rever logo não se cumpram.
Poucas coisas são tão boas na vida quanto esta generosa prova de amor fraternal que recebemos num encontro casual, sem formalidades, sem cargos se interpondo, só a velha e boa amizade mesmo, aqueles laços que mesmo as opiniões divergentes e os afastamentos físicos não conseguem desfazer. Nessas horas, dá uma sensação de que ainda existe esperança e que nem as falcatruas de maus políticos tampouco as maldades dos homens entre si e principalmente contra animais indefesos, a sede de poder e de enriquecimento, a competição absurda, a falta de coleguismo, enfim, toda a poluição emocional, nada disso invalida nossa capacidade de ser bom e feliz.
Evidente que ninguém é bobinho pra achar que o mundo é cor de rosa bebê e que tudo tem solução, que os malvados ficarão exemplares e que os perdidos se acharão. Sou absolutamente descrente neste igualitarismo totalitário, quer econômico, quer cultural, quer espiritual. Meu terreno é do indivualismo, da diferença entre cada um, da crença no progresso (e retrocesso) segundo méritos e vontade. Filosofices de sexta-feira, com certeza. De vez em quando é bom enxergar a vida por uma lente diferente daquela usual, que também precisa ser utilizada para que se vejam os problemas e, quem sabe, as soluções. E vamos em frente, assim, deixando aos pobres de espírito e aos medíocres se não nossa simpatia ao menos nossa piedosa indiferença. Vez que outra, é bom.