Dona Flor
A brincadeira não é nova. Por óbvia, já foi largamente usada na campanha eleitoral paulista. Mas, como muitas coisas não logram cruzar o Mampituba, …
A brincadeira não é nova. Por óbvia, já foi largamente usada na campanha eleitoral paulista. Mas, como muitas coisas não logram cruzar o Mampituba, vale comentar. Marta Suplicy, que já foi a Rainha Martaxa por sua voracidade tributária, agora é Dona Flor. Tal qual a personagem de Jorge Amado, desfila ora com um marido, ora com outro. O ex dá votos pela tradição de honestidade, ética e discrição. O outro, pela pose de galã da meia idade, a despeito dos modelitos bregas e das falas inconvenientes. O Planalto lhe mandou calar a boca, mas não adiantou.
O franco-atirador, perdão, franco-argentino Luís Frave, mais argentino do que franco, como definiu Xico Sá em excelente artigo no nominimo.com.br, tem mandado bem na campanha da esposa. O marqueteiro Duda Mendonça, que já serviu a Lula com a mesma desenvoltura com que defendeu Maluf, foi escanteado por Frave com a mesma facilidade com que o argentino se livrou do Eduardo Suplicy. Aliás, essa história de franco-argentino é uma bobagem conveniente, duvido que alguém usasse termo semelhante em outra circunstância. Argentino é argentino.
Mas Marta é uma Dona Flor às avessas, pois Favre cai bem no papel de Vadinho, enquanto, neste caso, o falecido é o pai do Supla (não poderia mesmo escapar impune). Eduardo tem desempenhado a caráter o papel do fantasma manso, enquanto Luís encarna o homem ideal, o que é fácil para quem, ao que se saiba, não pega no pesado há um bom tempo.
Na eleição ada, Marta cometeu estelionato eleitoral, pois foi às ruas angariar votos com Eduardo enquanto Luís descansava para os labores noturnos. ado o pleito, subitamente se apaixonou e se casou. A imprensa sabia havia muito tempo do caso dela com o argentino, como sabia do filho avulso do presidente Fernando Henrique. Em ambos os episódios, calou-se, o que foi bom, pois se trata de vida privada e nada tem a ver com performance istrativa. Pelo menos a mídia teve o mesmo peso e a mesma medida. Mas Marta enganou os eleitores. Sabe-se lá quantos conservadores não teriam mudado o voto se soubessem antes a respeito do namorado. Sim, porque a esquerda tem namorado, só a direita tem amante, vide o tratamento dado ao ACM.
Brasileiros esclarecidos de todos os quadrantes não mudariam seu voto por razões moralistas, mas não gostam de ser enganados. Como no caso Clinton, não foi o adultério o pretexto para os picaretas promotores independentes - uma típica praga americana - lhe pegassem no pé, mas o fato de ter mentido. Martaxa, adorada por incontáveis jornalistas-fãs, saiu-se incólume. O brasileiro será melhor quando deixar de lado a hipocrisia. Que cada um transe e faça filhos com quem quiser, desde que governo direito. Mas que Dona Flor assuma suas paixões antes de o povo ir às urnas. Pensando bem, desta vez ela está sendo honesta.
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Eliziário Goulart Rocha é jornalista e escritor, autor dos romances Silêncio no Bordel de Tia Chininha, Dona Deusa e seus Arredores Escandalosos e da ficção juvenil Eliakan e a Desordem dos Sete Mundos.