Cuidado: presidente irritado

Vivendo e aprendendo. Pela cartilha do presidente Lula e de seu primeiro homem da Comunicação Social, Franklin Martins, assuntos da pauta de jornalista têm …

Vivendo e aprendendo. Pela cartilha do presidente Lula e de seu primeiro homem da Comunicação Social, Franklin Martins, assuntos da pauta de jornalista têm dia e hora para serem abordados. O que me faz deduzir que estamos a um o de introduzir uma cartilha nova na relação entre mídia e fontes. Digo isso porque fiquei estarrecida ao ler que Lula não só ficou irritado com perguntas de jornalistas que acompanham sua participação na reunião do G8 sobre o possível envolvimento do irmão com a máfia dos caça-níqueis: nosso supremo mandatário, eleito duas vezes para gerir nossos destinos, fez beiço e disse que não achava justo, depois de um encontro de tal magnitude de que participara, perguntarem algo que ele poderia falar na segunda-feira!


Não sei se penso que Lula despreza mais o tema referente à situação do irmão ou o trabalho dos jornalistas. Como é que um homem público, que deve sua trajetória sobretudo ao apoio que teve, desde as portas de fábrica, quando, em nome da classe de desfavorecidos, brandia a mão mutilada contra os poderosos, agora se sai com essa? Esperar para dar notícia, presidente? Que falta de respeito com o trabalho de profissionais que andam, dia inteiro, com suas cadernetas, câmeras e microfones na mão, tentando fazer seu trabalho corretamente!


Para completar o bolero,  o recentemente entronizado ministro de Comunicação, Franklin Martins, igualmente mostrou sua contrariedade ao ouvir a pergunta. E o ex-comentarista global já teria se mostrado aborrecido anteriormente quando os enviados de mídias brasileiras haviam tentado falar sobre o caso do irmão presidencial, argumentando que a denúncia contra Vavá "está morrendo por inanição".


A atitude de Lula é criticável porque ele sabe que, como presidente de um país, e ainda mais um país constantemente, em especial em seu governo, sacudido por denúncias de corrupção e, mais grave ainda, denúncias que envolvem ou envolveram nomes de sua família, o correto é abrir o peito e o coração (para usar expressões dele) a qualquer momento em que for solicitado. Essa história de guardar perguntas para quando o humor presidencial estiver adequado parece brincadeira. Não dá para levar a sério.


Ou melhor. É preciso levar muito a sério. Estes atos de intimidação são comuns em regimes ditatoriais em que a imprensa anda na trilha estabelecida pelo poder. Já é difícil ser jornalista, indepedendentemente de regime e lugar, tantas são as coordenadas estabelecidadas, que vão do superior imediato em uma redação ao dono do veículo e suas ligações externas.


Se, a partir de agora, as notícias vão depender também do humor do entrevistado e suas regras estapafúrdias, não seria o caso de as mídias mandarem seus rapazes de volta para casa e ar a publicar apenas os releases da assessoria oficial, devidamente identificados?


Vivemos, já, um jornalismo pasteurizado, perfil que se evidencia ao fazer uma leitura comparativa dos veículos que, em sua maioria, recortam e colam notícias de agências e de assessorias, quando não dão de mão em matérias alheias sem publicar a fonte.


Na maioria dos casos, ouvir rádio, ver tv, ler jornal e matérias de internet é uma tarefa aborrecida tal o grau de semelhança dos textos e das informações. É, mais que um jornalismo apressado por necessidades de dead line e outras mais, um jornalismo preguiçoso. E, se não houver vigilância, e se depender de Lula e de seu porta-voz Franklin Martins, vai se tornar  um patético e triste jornalismo agendado oficial. Com direito a plaquinha no portão: Cuidado! Presidente irritado.

Autor

Jornalista formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Maristela Bairros já atuou como redatora, repórter, editora e crítica de teatro nos principais diários de Porto Alegre, colaboradora de revistas do Centro do País e foi produtora e apresentadora nas rádios Gaúcha, Guaíba AM, Guaíba FM e Rádio da Universidade, assessora de imprensa da Secretaria de Estado da Cultura e da Fundação Cultural Piratini. É autora de dois livros: Paris para Quem Não Fala Francês e Chutando o Balde, o Livro dos Desaforos, ambos editados pela Artes & Ofícios.

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