"Os poderosos fazem a maldade parecer mais feia do que ela é?. 6f2s5g
G.K.Chesterton.
"- Estou dentro de um homem ou dentro de um assassino?" era a dúvida do Padre Brown em sua estréia, há mais de 100 anos. Mais do que uma frase de efeito, o padre-detetive questionava a presença do mal entre os homens. Os estudiosos da obra de Gilbert Keith Chesterton ainda debatem a enigmática figura do personagem, que antes de apontar o criminoso, tenta saber o que o levou ao caminho do crime.
***
Ele afirmava que o crime é muito semelhante a uma obra de arte. E que não devemos nos deixar surpreender, pois o crime não deixa de ser apenas a mais popular das obras de arte que sai das oficinas de Satanás. Mas o que mais chama a atenção nas teses teológicas do Padre Brown é que surgem muitos anos antes da conversão de seu criador ao catolicismo. O personagem de Chesterton não ficou conhecido apenas pelas virtudes de sabedoria e inocência, que dão títulos a dois dos seus livros.
Pois ao mesmo tempo, existem outros livros que demonstram as perplexidades chesternianas diante da natureza humana. Quando não mordacidade e ironia, como em O Segredo do Padre Brown. Ali, ele conversa com um amigo, padre O'Connor, quando cruzam por alguns estudantes de Cambridge; eles fazem o comentário de que os sacerdotes vivem alienados do mundo real. A réplica é imediata e mordaz:
"- Os jovens sabem tanto do Mal como crianças em um carrinho de bebê."
O episódio permite a ilação que, em sua aparente inocência e candura, o Padre Brown conhece mais do crime do que possa parecer. Na época em que G.K.Chesterton apresentou seu padre-detetive, as livrarias estavam sortidas de novelas policiais. Podia-se escolher entre detetives populares como Sherlock Holmes, Miss Marple, Hercule Poirot ou até os norte-americanos Nero Wolf e Philip Marlowe.
***
Em sua sabedoria bíblica, o Padre Brown pratica métodos de investigação em muito diferentes dos colegas dos dois lados do oceano. Acima de tudo, marcada por um apego visceral ao bom senso e à recusa em aceitar fatos contrários à lógica. Ele mesmo confessa como seus métodos são simples:
?Eu estudo cada caso com o máximo cuidado. Imagino como e quando o crime aconteceu, qual o estado de espírito do criminoso e o que o levou a praticar o ato. E somente quando me sinto pensando exatamente como o criminoso, eu posso descobrir quem é ele?.
Eis aqui um típico paradoxo chesterniano: a solução de um crime e a descoberta do criminoso não é um ato científico e policial, mas um exercício de ortodoxia religiosa. Para o detetive de batina, o objetivo não é apenas a entrega do bandido à justiça dos homens. Ele deve se encontrar com o pecador, pedir que se arrependa, abrindo caminho à sua salvação.
***
Em 1935, o Escândalo do Padre Brown antecipava as dimensões espirituais embutidas por G.K. Chesterton no personagem. O ano coincide exatamente com a crise de fé que acomete o autor, que faz uma reflexão:
"O que salva o confessor e o pecador é a viagem ao centro de si mesmos para reconhecerem o horror da maldade. Para então retomar o caminho da verdade, do remorso e da compaixão."
***