Crau nessa Crise

Não confio nessa Crise que taí. Vocês já repararam que Crise mais esculhambada? Tudo nela é torto, mal concebido, incompetente, não funcional. Essa Crise …






















Não confio nessa Crise que taí.

Vocês já repararam que Crise mais esculhambada? Tudo nela é torto, mal concebido, incompetente, não funcional. Essa Crise me dá nojo só de olhar.
É a Crise mais enjambrada que já tivemos por aqui. Confiram o peso dela: deve estar faltando algum sobrepeso, nos roubaram na balança. Verifiquem o tamanho dela: nem a das medidas! Ai, que Crise chata, estagnada, mal acabada.


Quem foi o responsável pela encomenda dessa Crise? Será que não haviam melhores, digo, piores pelo mesmo preço desta? É o que dá confiar nessas comissões de compras do Governo - esse que taí ou qualquer outro que foi ou virá. Ah, lembro das crises de antigamente, tão bem feitas, perfeitamente estruturadas, produzidas no capricho. O porte e o estilo logo agradavam em
cheio aos brasileiros.


Bons tempos aqueles, em que as Crises eram aquilo mesmo que diziam delas. Agora, essa Crise aí, é como um pântano de Hollywood - a gente entra porque sabe que não é verdadeiro. Eu queria era uma Crise com marca registrada, brasileira mesmo. Com garantia de um ano de uso ou o meu dinheiro de volta.


Aliás, durante o tempo em que estou, vá lá, usufruindo dessa Crise atual, consegui alinhar vários defeitos inissíveis nela. Por isso faço esta queixa, já que não tenho a quem reclamar. Que país é este, onde até as Crises não oferecem aquilo que prometem? É previsão que não fura, é orçamento que estoura menos do que devia estourar, é locupletação que não se completa, é desgraça que vem mas vai logo embora - vergonha geral.


Sabem de uma coisa? Pra mim chega. Quero outra Crise, modelo 2007, novinha, sem os problemas de Crises adas. E pediria também que zelassem mais pela Crise. Há tantos aí que podem piorá-la e nem estão tendo uma chance de demonstrar suas incapacidades. Vamos lá, senhores, já que estamos à beira da pindaíba, que entremos bem pelo cano. Uma Crise à altura do desastre nacional é o desejável, senão essa Crise nem vai pra frente. Não tentem me enganar com Crises menores!


Vejam só que Crise: rendeu apenas este texto mal inspirado.


Enquanto isso, esses contrastes.

Enquanto alguns fazem terapia ocupacional,
milhares de milhares experimentam o desemprego.


Enquanto poucos necessitam de moderadores do apetite,
muitos comem brisa.


Enquanto uns vão à sauna no fim do expediente,
a maioria se desidrata durante.


Enquanto meia dúzia segue fashion,
tantos seguem em farrapos.


Enquanto raros recorrem à cirurgia plástica,
milhões não conseguem tratar a anemia.


Enquanto determinados investem no open market,
dezenas suplicam na porta de cada supermercado.


Enquanto alguns praticam jogging,
incontáveis correm da própria sombra.


Enquanto aquele lá tem pompas fúnebres,
estes aqui não têm onde cair mortos.


Etc.


Defignições


Academia Brasileira de Letras - Uma associação sem fins criativos.
Analfabeto - Pessoa privada de centenas de excelentes obras.
E poupada de milhares de péssimos livros.
Apolítico - O mesmo que acéfalo.
Cartel - Quadrilha que em vez de máscara, usa uma razão social cmo disfarce.
Celulose - Na lareira, aquece o corpo; na impressora, aquece o espírito.
Bala perdida - É aquela que em vez de fazer uma vítima, faz outra.
Desilusão - É quando você cai das nuvens num dia de céu límpido.
Desorientado - Um sujeito cuja bússola tem a agulha num palheiro.
Dignidade - Nossa 34a vértebra.
Eunuco - Homem em situação invejável numa condição indesejável.
Fatalidades - São os acidentes em que não se consegue apurar as responsabilidades.
Humor negro - O que doura a pílula com chumbo.
Lágrima - Alma destilada.
Libido - Instinto que sempre gozou de popularidade na cama mas que só obteve notoriedade no divã.
Metafísica - Gaveta hermeticamente aberta.
Pio - Aquele que, mesmo achando Deus injusto com ele, não pia.
Reputação - Isso que sobra da soma das impressões que você causa descontadas as vezes que você não impressiona ninguém.
Rigor mortis - A cãibra definitiva.
Suicídio - Acordo de extrema cumplicidade entre o assassino e a vítima.
Transplante - O ato cirúrgico de transferir um corpo doente para um
órgão sadio.
Vidente - Mulher que prevê o futuro através da mais aguçada vaguidão.

Autor
Fraga. Jornalista e humorista, editor de antologias e curador de exposições de humor. Colunista do jornal Extra Classe.

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