Cores & Sabores

Por José Antônio Moraes de Oliveira

Quando acenderam o fogão a lenha pela primeira vez naquele inverno, me vi de volta aos doces tempos da infância. Estava de cara lavada e de cabelo penteado, no meu lugar na mesa da cozinha da fazenda do o Grande. Era meio-dia e a casa se perfumava com os aromas dos preparos e temperos. Minha mãe e as tias se revezavam arrumando pratos, copos e talheres. E logo vinham os ões de ferro, carregados de feijão preto, arroz de carreteiro e nacos de carne assada de porco, gado e ovelha.

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Eram refeições à moda campeira, demorados, sem pressa, as pessoas saboreando cada garfada como fosse a última. As mulheres da casa pareciam não sentir fome, ocupadas em encher e reencher as e pratos. Se bebia apenas água fresca tirada há pouco da cacimba. A conversa voltava mansa, quando os pratos ficavam vazios, pois  era hora das compotas de frutas de Dona Ana Augusta.      

Nas prateleiras acima de minha cabeça, se alinhavam os vidros coloridos das compotas, rótulados com as letras desenhadas da Tia Vieira, a mais doceira das minhas tias. Recordo de quando o sol da tarde batia nos vidros de doce, fazia brihar os amarelos, vermelhos, verdes, roxos e azulados dos ananás, ameixas pretas, bergamotas, batatas-doce, figos, goiabas, morangos e marmelos.

As minhas lembranças mais recorrentes são as do olfato  e do paladar. Me é comum esquecer nomes, rostos ou lugares. Mas guardo bem os sabores da ambosia e da banana frita que a mãe me servia. E o aroma adocicado do jasmim-manga de nosso jardim.

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Certa vez visitei a vila de Grasse, na França, que produz óleos essenciais para as grandes griffes da perfumaria mundial. São fórmulas secretas, guardadas por mestres perfumistas, que são chamados de Narizes, dotados de olfatos capazes de identificar centenas de fragâncias e aromas. Em Grasse o visitante é convidado a testar seu olfato, identificando aromas como jasmim, rosa e lavanda. Mas é missão impossível, pois após algumas tentativas, o olfato fica saturado e não se sente mais nada.

Ao tentar reconhecer fragâncias fui levado de regresso aos meus dias de menino, quando me embriagava com as cores, aromas e sabores dos doces da minha avó Ana Augusta.

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Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem agens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

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