Coopítulo 95 - Os fiadores reembolsados II
Por Vieira da Cunha

Estou resgatando neste espaço o episódio do calote que os associados Clarice Aquistapace e Antonio Gonzales sofreram quando a Cooperativa dos Jornalistas encerrou suas atividades, em 1983. Em carta que me enviou em setembro de 1985 desde Nampula, Moçambique, onde estava trabalhando em uma ação de comunicação para um organismo da ONU, Osmar Trindade, que me sucedera na presidência da Coojornal, escreveu: "Chateou-me saber o desfecho do empréstimo da Coojornal junto à Caixa e os problemas para o Gonzales e a Clarice. À distância, só posso mesmo ficar chateado".
O registro do desdobramento do episódio é feito aqui com a maior objetividade e clareza por nosso advogado na época, o também jornalista Marco Túlio de Rose, que foi o autor da ação vitoriosa contra a Prefeitura de Porto Alegre devido a um imposto cobrado irregularmente da cooperativa. Segue o seu relato, cuja primeira parte foi publicada semana ada aqui neste mesmo espaço:
"Antes de contar o destino do dinheiro, vamos falar quanto era e, para dar atualidade aos valores, convertê-lo em salários mínimos da época. O valor pago a ser devolvido era de Cr$ 265.713,10, o que correspondia a 170 salários mínimos do tempo. Quando foi recebido, a moeda era o cruzado e o que foi pago (Cz$ 212.127,90), convertido pelo salário mínimo de agosto de 1989, diminuiu para 155 salários-mínimos, o que equivaleria, em abril de 2025, pelo atual mínimo, a R$ 235.000,00. A diferença de 15 salários foi motivada pelo desconto de uma dívida trabalhista que a Cooperativa deixara e que o presidente Vieira, quando lhe informei que o valor estava disponível, fez questão de saldar.
O destino do dinheiro foi talvez um último ato de grandeza de nossa Coojornal. Eu sempre mantivera contato com o Vieira, para lhe avisar, quando do pagamento, para que ele decidisse sobre a destinação, pois àquela altura a Coojornal sucumbira debaixo do peso da pressão econômica que os agentes da Ditadura Militar exerceram sobre a sociedade, o que ocasionou o fechamento do mercado para seus serviços e a extrema escassez dos patrocínios (os anunciantes eram visitados por militares e desaconselhados de seguir fazendo propaganda nos veículos da Cooperativa).
Vieira sempre me dissera que alguns jornalistas, que eram fiadores da Coojornal, haviam sido executados quando ela não mais conseguiu pagar os alugueis e que ele entendia justo que eles recebessem a totalidade dos valores. Assim foi feito.
O pagamento ocorreu em novembro de 1989, avisei Vieira e por uma série de desencontros conseguimos agendar a ida até a Associação Riograndense de Imprensa ao final de fevereiro de 1990, se não me falham as datas, quando foi devolvido todo o valor aos fiadores, jornalistas Clarice Aquistapace e Antônio Gonzales. Nunca esqueci a grandeza com que fomos recebidos pelo Antoninho, então presidente da ARI, que muito mais do que estar feliz por receber seu dinheiro, mostrava satisfação pela demonstração de profundo bom caráter que aquele gesto representava.
Mais uma das histórias dessa experiência extraordinária e vanguardista que foi nossa Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre. O dinheiro não chegou a tempo de ajudar o empreendimento, mas ainda foi suficiente para honrar o compromisso financeiro que aquele grupo de heroicos profissionais assumira."