Coopítulo 43 - Nos anais da ditadura
Por José Antonio Vieira da Cunha

O Coojornal teve problemas com a censura, muito ruins, mostrados aqui em episódios anteriores. Suas reportagens abordavam temas atuais, exploravam aspectos históricos e comportamentais, e eram batalhadas por jornalistas que não faziam militância ideológica. Produziam trabalhos com relevância histórica e de crítica sobre o jornalismo e a política, em conteúdos cuja tônica revelava, antes de tudo, profissionalismo.
Bernardo Kucinski registrou muito bem este aspecto quando assinalou, em seu livro Jornalistas e Revolucionários, de 1991:
- O Coojornal foi não só a maior cooperativa de jornalistas jamais formada no Brasil, como também o primeiro projeto de organização jornalística ampla que adotou a doutrina cooperativista como fundamento de sua atividade e procurou adaptá-la a uma práxis jornalística.
É isso aí, vivia-se de prática, não de teoria. O mensário dava especial atenção à imprensa, ao exercício do jornalismo, uma área muito pouco avaliada naqueles tempos em outras publicações. Um raro suspiro vinha do Jornal do Brasil, que editava cadernos de jornalismo e encantava leitores com a coluna Jornal dos Jornais, assinada por Alberto Dines, que depois criaria o portal Observatório da Imprensa. Não era isso que a censura dos anos 70 e 80 identificava no Coojornal, muito antes pelo contrário. Um relatório do Serviço Nacional de Informações, com o título "Acompanhamento da atuação da imprensa do RS", em fevereiro de 1980, revela os preconceitos, o despreparo e a ignorância dos agentes federais da época, mais preocupados que estavam em identificar um comunista em qualquer cidadão que, parado na esquina, fumava um cigarro.
O documento analisa o posicionamento do que a censura federal considerava os principais jornais da época: Correio do Povo, Folha da Manhã, Folha da Tarde, Jornal do Comércio, Zero Hora e... Coojornal, um único mensário entre os cinco diários. Ali está registrado como "órgão de imprensa 'ALTERNATIVA' (destaque dos autores...), publicado mensalmente, com tiragem de 35 mil exemplares". Boa parte daquele período vivido pela imprensa gaúcha está retratado ali, com suas contradições e concessões.
O Correio do Povo é destacado como um veículo que se mantém "dentro de uma linha séria e sem deturpações. Geralmente assume posicionamento concordante com o Governo Federal". A Folha da Tarde é "um vespertino de linha apolítica", que "não faz oposição ao Governo", enquanto a irmã Folha da Manhã (de cujos quadros saíram boa parte dos fundadores da Cooperativa dos Jornalistas) merece outro conceito: tem conteúdo critico contrário ao oficialista e traz "artigos, manchetes sensacionalistas e charges" nos quais "distorce os fatos".
Para a censura, o Jornal do Comércio era totalmente amigável em relação à postura governamental. Zero Hora também é considerada mais confiável, como a Folha da Tarde, posicionando-se de forma "favorável ao Governo Federal". Mas há uma queixa dos censores: "No seu todo, o jornal dá maior destaque para a oposição e para qualquer assunto ou movimento contrário ao Governo e ao Regime Político atual". E sem qualquer juízo de valor, o vigilante censor acrescenta um apêndice: ZH é o único que divulga notícias da agência soviética Novosti.
O jornal da cooperativa de Porto alegre era visto assim, na grafia original: "Encontra-se dentro da mesma linha de orientação dos demais jornais da imprensa 'ALTERNATIVA', que atuam no país, apresentando conteúdo frontalmente contrário ao Governo, às suas instituições e ao Regime Político implantado em 31 MAR 64".
(Continua)