Coopítulo 36 - Dr. Leonel
Por José Antonio Vieira da Cunha

Leonel de Moura Brizola seguia fazendo história no final dos anos 70, mesmo exilado. O líder vitorioso da Legalidade e o líder frustrado da resistência ao golpe em 1964 estava longe do torrão, mas seguia atento, inquieto e mobilizador como sempre. Durante algum tempo a menção de seu nome na imprensa brasileira estava vetada pela censura federal, o que provocou atritos inclusive com a pacata Caldas Júnior, que em certo momento teve tanto o Correio do Povo como a Folha da Manhã recolhidos por avançarem o sinal, na ótica da repressão, ao reportar declarações do líder trabalhista.
O Coojornal acabou sustentando uma relação de amor e ódio com Brizola, parte fruto de incompreensões, parte porque ele, impositivo como sempre foi, era refratário a críticas. Foi manchete e recebeu um generoso espaço editorial quando, em novembro de 1977, revelou que estava pronto para retornar ao Brasil e trabalhar pela fundação do novo PTB, o Partido Trabalhista Brasileiro que, como todos os demais, fora extinto pelo governo militar.
Foi narrado aqui outro dia; a declaração soou como uma bomba e o ineditismo de sua publicação no Coojornal deu-se graças ao fato de o jornalista Afonso Ritter, em férias, ter tido a curiosidade suficiente, aliada ao talento jornalístico, para procurar o político que vivia em Nova Iorque. "Voltar... e fundar o novo PTB" foi a manchete, em um texto em que o político deixava bem claro que só poderia pisar novamente em solo brasileiro quando houvesse anistia - que acabou promulgada em 28 de agosto de 1979.
"Surgiu praticamente do acaso", diria depois o Ritter, feliz por ter dado aquele furo de repercussão nacional por sua importância no cenário político de então. Todos os jornalões deram espaços e chamadas de capa para aquelas revelações de Brizola, que mais tarde diria que aquele foi um momento importante na trajetória e retorno ao Brasil. Ponto para o Coojornal, portanto.
Então: o trabalhismo e seu líder maior receberam muitas atenções da redação do Coojornal porque faziam História, mas esta relação teve também sobressaltos e incompreensões. Quando, em dezembro de 1978, o mensário trazia mais uma reportagem histórica, que teve ampla repercussão nacional, Brizola não gostou nem um pouco. Debaixo do título "Este homem quis incendiar o país", seguiram-se detalhadas e ricas informações dadas pelo coronel Jefferson Cardin Osório, líder do movimento de resistência ao golpe militar de 1964 que tinha como ponto de partida a tomada do município de Três os, no norte do Rio Grande do Sul.
Ao lado do ex-sargento da Brigada Militar Alberi Vieira do Santos, o coronel do Exército detalhou a operação que envolveu 23 guerrilheiros, quase uma espécie de exército Brancaleone, que acabaram presos por tropas do Exército quando entraram no Paraná. Brizola estava no centro da declaração dos dois militares, que o apresentaram como o organizador do plano que pretendia dar um contragolpe ao governo militar. E não gostou de dois momentos relevantes do depoimento. Um, o de que ele teria recuado quando o movimento fracassou, distribuindo uma nota em que declarava não ter nada a ver com aquilo. E dois, e o que certamente o feriu mais, foi a declaração de que o movimento era apoiado por Cuba, que teria enviado um milhão de dólares - dos quais 500 mil teriam ficado com Brizola.
De novo, a repercussão foi imediata e ruidosa. Em 19 de dezembro, um dia após o Coojornal circular - e circulava em bancas das principais cidades do país, convém relembrar -, Folha de S.Paulo, Estadão, Jornal do Brasil e O Globo, entre tantos, deram suítes ao tema entrevistando personagens destacados na época, entre eles o historiador Décio Freitas e o escritor Josué Guimarães. Ambos próximos ao ex-governador, negaram a oferta dos dólares cubanos, assim como Darcy Ribeiro, outro grande amigo, que considerou "estranhas" as declarações do coronel.
Outra grande reportagem histórica, essa sobre a guerrilha de Caparaó e um pretenso envolvimento de Brizola, deixou-o novamente incomodado. Mais tarde, em julho de 1992, o Jornal do Brasil publicou a síntese de uma tese universitária que abordava o movimento com o mesmo enfoque dado pelas fontes do mensário da Cooperativa dos Jornalistas. "Eu não assumo o episódio porque realmente não foi da minha iniciativa", ele disse, acrescentando que estava desconfiado que o autor da matéria do JB teria sido repórter do Coojornal, "um jornalzinho", em suas palavras, "cuja razão de existência foi intrigar o Brizola". A frase, fruto da rica retórica do ex-governador, que neste 22 de janeiro recebeu todas as homenagens pelo centenário de seu nascimento, é cruel e não expressa a verdade histórica. As páginas do Coojornal estão aí pra comprovar.
