Maconhista
Por José Antonio Vieira da Cunha

Maconheiro todo mundo sabe o que é e não há quem não tenha amigos e parentes nesta classificação. Maconhista é diferente; há várias definições, entre elas a de que se trata de pessoa ou organização que defende a legalização da produção da cannabis medicinal e seu consumo de forma controlada, com acompanhamento médico e social.
Estou nesta última categoria. Por duas décadas sofri dores quase ináveis na região da cervical. Durante uns cinco destes anos perambulei por consultórios de especialistas, como traumatologistas, ortopedistas, quiropraxistas, homeopatas, fisioterapeutas, uma multidão, sem sucesso. Foram mesmo dezenas de médicos e profissionais da saúde, e um deles, inclusive, depois de uns seis meses de tratamento sem resultado, jogou a toalha e se desculpou: era especialista em joelho, a cervical fugia a seus conhecimentos...
Uma amiga, também ela médica, intuiu, a partir de uma conversa informal, que algo estava muito errado; afinal, dezenas de consultas, centenas de tratamentos e cinco anos depois, não era normal que nada minorasse o sofrimento. Investigou, consultou outros colegas com quem trabalhava no hospital, e trouxe a sugestão de que eu deveria consultar um neurologista. Fui orientado a procurar um especialista competente e atencioso, que identificou que meu tormento era uma distonia cervical, ou torcicolo espasmódico.
Durante cerca de dez anos me tratou com a aplicação de toxina botulínica. A cada quatro meses, em média, lá ia eu submeter-me às dolorosas aplicações de botox na região do pescoço. Doía mas valia a pena, pois durante uns 75 dias as dores praticamente cessavam. Mas bastava o botox começar a perder efeito que, na direção oposta, as dores na cervical retornavam, tão intensas quanto sempre.
E assim foi durante os anos até que... até que descobri a salvação na maconha. Quer dizer, salvação na cannabis medicinal. Fui apresentado a extratos da planta para fins terapêuticos - no meu caso, colocando algumas gotas de óleos à base de THC e CBD debaixo da língua. A identificação da dosagem exata, ou correta, levou algo em torno de quatro meses. Estava a ponto de desistir quando, aleluia, a cannabis começou a surtir efeito, um efeito generoso que praticamente zerou as dores abomináveis que me atormentavam a vida.
A forma de aplicação é fácil e natural. O extrato dissolvido em óleo vegetal é consumido através de um conta-gotas, que ajuda a controlar a dosagem do medicamento, procedimento que faço três vezes ao dia, após as principais refeições. Sob a língua, o efeito é quase imediato, ao contrário de cápsulas, que no caso da cannabis medicinal existem, também.
Faz um ano, mais ou menos, que estou nesta batida, e com ela fui apresentado ao mundo da maconha do bem. Mais do que isso, a um mundo sem aquelas dores que algumas vezes, tão intensas, me tiravam do sério e da boa convivência social.
Recomendo com entusiasmo, mas lembre-se: é medicamento, e para sua aplicação é necessário acompanhamento médico.
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A querida Rosvita, ou Fita, ou Gorda, nos abandonou. Os que a conheceram têm muito a lamentar e prantear, e algumas homenagens lindas foram prestadas a ela por amigos. Sugiro a leitura destas duas, que o jornal JÁ publica: um artigo do Elmar Bones, com quem Rosvita trabalhou na Folha da Manhã e no Coojornal, e um texto do Fraga, dois queridos amigos comuns.