Caça aos leitores
Por Flávio Dutra

Uma pesquisa do IPO (Instituto Pesquisas de Opinião) foi um balde de água gelada em pleno inverno sobre quem lida com a produção de livros no nosso Rio Grande. O IPO, dirigido pela competente Elis Rann, minha vizinha de coluna aqui neste espaço, publicou, na semana ada, levantamento revelando que o hábito da leitura não faz parte do cotidiano de 48,3 % da população gaúcha. É quase o mesmo dado da tendência nacional de 48%. Porto Alegre replica também o mesmo comportamento estadual. Em síntese, a pesquisa indica que a maioria dos gaúchos lê, em média, três livros ao ano.
Surpreende negativamente os dados referentes ao Estado, onde pipocam no interior várias iniciativas de fomento à leitura, sobretudo para estudantes, e mais ainda em relação a Porto Alegre, orgulhosa de sua concorrida Feira do Livro. Talvez esses dados pouco alentadores tenham a ver com nosso sistema educacional, que já foi referência, mas vivendo uma fase de IDEB em baixa. Uma das conclusões da pesquisa indica que "quem mantém um vínculo cotidiano de leitura, ativa um ciclo virtuoso em sua vida, pois a educação fomenta o hábito de leitura e o hábito de leitura aumenta a educação". Vale ressalvar que a pesquisa foi com a população adulta, sem mensurar os jovens, que estão cada vez mais conectados.
Como referi na abertura, o resultado da pesquisa é um desestímulo para quem esta envolvido com projetos editoriais. Sabe lá o que é disputar com nomes consagrados os três livros lidos, em média, pelos gaúchos?
No meu caso, tenho pelo menos quatro produtos editoriais em andamento, dois deles para os próximos meses. Além disso, venho insistindo com vários parceiros para que publiquem seus escritos. Tem coisa boa entocada e estocada, implorando publicação. Muita gente resiste por falta de condições financeiras para bancar o livro, incerteza quanto à aceitação da obra para recuperar o investimento e mesmo por não se enxergar como dotado de qualidades literárias. Mas eu insisto, acrescentando que escritor constrangido, com inibições, fica talentosamente inédito.
O mercado do livro, na contramão da pesquisa da IPO, parece estar aquecido no Brasil. Pelo menos é o que deduzo pelas inúmeras postagens que recebo nas redes sociais de serviços que oferecem facilidades para a edição de livros. O apelo dos negociantes, na maioria dos casos, é o aceno de que o sucesso literário está logo ali, e que o serviço oferecido tem a fórmula desse sucesso. Não faltam dicas de como escrever o romance que vai garantir o Prêmio Jabuti e, quem sabe, a indicação para o Nobel de Literatura.
Prefiro confiar nos parceiros locais, os quais consulto sempre que necessito e eventualmente uso os préstimos deles. Estou falando do Auber Lopes de Almeida, da Farol 3 Editores, da Cláudia Coutinho, do Capítulo 1 e do Paulo Palombo Pruss, da Editora Escuna, que lutam bravamente para se manter no mercado.
Com o apoio deles, tenho a garantia de um bom produto final. Mas se, mesmo assim, nada der certo, se a caça aos leitores for infrutífera e o sucesso ar ao largo, vale lembrar, como consolo, o que disse o português Jose Saramago, Nobel de Literatura: "Creio que o escritor escreve para si mesmo." Humildemente, assino embaixo, mestre Saramago.