Barulhos embaralhados
As gráficas estão lotadas de trabalho. Webdesigners trabalham de sol a sol. A comunicação está em alta. É temerário dizer qual setor está melhor, …
As gráficas estão lotadas de trabalho. Webdesigners trabalham de sol a sol. A comunicação está em alta. É temerário dizer qual setor está melhor, pois ainda não existe o analista isento.
Somos nossas palavras.
Interrompeu seu raciocínio a um som embaralhado: as palavras não param.
Voltou a escrever:
Nossas opiniões são nossas experiências. Não existe observador que não modifique ou não influencie o meio observado. Portanto, só podemos falar sobre o que acontece em nossa volta.
O barulho de algumas pessoas no entorno impediu-a de continuar.
Somos nossas palavras. E as dos outros.
Começava a enxergar: a criatura suave e sensual sentou em um café. A musiquinha de Natal cortava seu barato sem dar folga. Ela quase perdeu o charme, mas entregou firme o cardápio ao garçon e afirmou, a seco: quero um záz. O infeliz, acostumado a servir um expresso e olhe lá com bolachinhas o dia inteiro, investigou o impresso e no pé da página leu: tequila, suco de limão e sabe-se lá mais o quê. Uau!
Fu Lana espalhou suas folhinhas daqueles bloquinhos de grátis pela mesa. Escrevia sem ordem. Irritava-se. Basicamente, não ava ser interrompida. Tentava abstrair as vozes irritantes ao redor e mandou ver. ou a imaginar livros como autores amordaçados. E o imbecil, de gravata borboleta, assobiava absorto e, na verdade, estava ligadíssimo nos afazeres da donzela. Pôrra! Ela tinha, finalmente, uma visão, e aquilo! Concentrou-se.
Somos palavras. Até dormindo, somos palavras.
O melhor lugar para se estar é em uma livraria, pequena ou grande, cercada de? autores amordaçados!!! Imaginava todos sentados, com olhares de súplica aos leitores antes. Alguns caprichavam nos dourados, nos relevos e nos vernizes, e outros, encafifados, arrogantes e desdenhosos, arriscavam um olhar a um deles que, de repente, parou.
Tirou a mordaça e abriu o livro ao acaso. O autor saiu falando? frases puladas, conforme o olhar indeciso do leitor-consumidor-em-potencial. Afinal, o indivíduo, lembrando de um compromisso, repôs a mordaça no livro e sentou-o na prateleira. O exercício repetia-se a cada comprador. Alguns alisavam os autores, avam as mãos e até cheiravam, mas não liam e muito menos compravam.
E assim, logicamente, não ouviam.
Palavras presas são promessas. Palavras conectas têm o poder de mover as vontades. Amordaçados, os autores somente prometiam alguns prazeres. Dos ditos aos não-formuláveis. Livros fechados para sempre eram pesadelos freqüentes de Fu Lana. Ela morria de medo de esquecer seus sonhos, que estariam mortos forever. Escrevia ao primeiro minuto em que abria os olhos, mas eles perdiam a energia no esvanecer da manhã. Fu Lana estava definitivamente dentro de sua fantasia, viajando em sua visão, feliz, enfim.
Somos palavras. Até dormindo.
Nossos gestos são palavras, nossos melhores os são palavras. As gráficas estão abarrotadas e o cérebro funciona melhor conectado. Confessa insone, Fu Lana percebeu que o záz estava no final. E sua força de vontade em abstrair o ambiente estava novamente acabando. Na prateleira, ao longe, subitamente, percebeu o olhar desesperado de um autor, que prometia idéias leves, como a vida à beira do rio, ou a suave ada do vento quando tudo tinha sido desesperança. Levantou, pagou a conta e desamordaçou o pobre. Ele declamava ao seu redor, quando ela pagou a conta.