Até quando precisaremos gritar que não somos culpadas? 5c6632

Por Márcia Martins 6j1d53

10/04/2025 12:49 / Atualizado em 10/04/2025 11:20
Até quando precisaremos gritar que não somos culpadas?

Uma reportagem da Agência Brasil de 10 de março de 2025 aponta que nove em cada dez agressões cometidas contra mulheres nos últimos 12 meses, ou 91,8%, foram testemunhadas por outras pessoas. E que a maioria (86,7%) era pertencente ao círculo social ou à família da vítima. Mas, para espanto geral, quase metade das vítimas (47,4%) optou em não denunciar a violência e nem procurar ajuda de instituições ou de pessoas próximas. Será porque o agressor, na grande maioria das vezes, é beneficiado pela justiça? Ou será porque a palavra da vítima é sempre questionada? 2y4xf

Em relação ao perfil de quem presenciou as agressões, há a constatação de que 47,3% eram amigos ou conhecidos das vítimas, 27% eram filhos, que formarão uma ideia futura de família como um cenário inseguro e caótico, e 12,4% tinham outro grau de parentesco. Os dados acima ? divulgados pela Agência Brasil ? integram a 5ª edição do relatório Visível e Invisível: a Vitimização de Mulheres no Brasil, encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). E indicam como é difícil para a mulher ter que denunciar. E como é penoso ter que revelar tal situação.

A dificuldade em procurar ajuda nos casos de violência encontra um território farto na reviravolta do caso Daniel Alves. Após 400 dias da condenação por estupro, a Justiça da Espanha decidiu, por unanimidade, pela revogação da sentença. Que já havia sido considerada baixa ? quatro anos e seis meses de prisão ? pelos movimentos de direitos humanos e feministas de todo o mundo. Tal anulação da pena é um retrocesso, em todos os aspectos, na luta contra a violência sexual. Cada vez mais, as vítimas são desestimuladas a realizarem as denúncias contra os seus agressores.

Até quando precisaremos gritar que não somos culpadas? Até quando será preciso repetir que qualquer ato sexual, sem o consentimento, é considerado sim estupro? Até quando teremos que insistir que não é sempre não. Apenas e só isso. O não dito pela mulher não quer dizer: "talvez", "tente daqui uns minutos", "quem sabe após uma insistência". Não é não. Respeitem a palavra das mulheres. Até quando vamos conviver com o medo de voltar da rua no meio da noite e sofrer uma perseguição? Até quando seremos julgadas pela roupa que vestimos? Até quando a impunidade dos agressores?

Essa coluna é um desabafo de quem está cansada de ver que julgamentos equivocados de violência contra as mulheres funcionam como um indicativo de que a denúncia nem sempre vale a pena. É um desabafo de quem já viu em muitos casos a palavra da vítima não ser valorizada o suficiente. É um desabafo de quem não entende porque quando a palavra da vítima não basta, a dúvida sempre será a favor do réu. É um desabafo de quem não a mais ver o assediador sair livre e faceiro enquanto a mulher tem a sua vida totalmente destruída.

É um pedido de respeito para que a nossa voz seja ouvida e valorizada. É uma esperança remota, mas que ainda não abandonei, de quem um dia, quem sabe, num futuro distante, o agressor não seja beneficiado. É uma súplica a todas as mulheres que não se deixem influenciar por decisões que ignoram o nosso sofrimento e façam as suas denúncias. Pela minha filha. Pelas próximas gerações. Por todas nós.