Andando em círculos
Caminhamos para o fim de 2006. Ponto. Resistindo à tentação de dizer que tudo ou voando, que a vida é só andar atrás de …
Caminhamos para o fim de 2006. Ponto. Resistindo à tentação de dizer que tudo ou voando, que a vida é só andar atrás de dinheiro para pagar contas e outros quetais, tento me focar no noticiário em busca de assuntos relevantes para escrever. E me dou conta, mais uma vez, que aquela história da circularidade existe, pelo menos no jornalismo. Se não, qual seria a razão para andarmos lendo, de novo, notícias sobre a exibição das calcinhas dos famosos em momentos de descuido ou, pior, a ausência da peça por celebridades em busca de holofotes? E para iluminar justamente o quê!
Trabalhei um tempão no chamado jornalismo de variedades, nomezinho cretino para uma área tão importante que abrange a cultura e as atividades de lazer (houve tempo em que era chamada de editoria de frescuras?) e vi, com o ar do tempo, que as notícias de coisas "sérias" perdiam ibope para as fofocalhadas a respeito de qual artista se separara de quem e qual andava beijando quem nos últimos dias.
Neste rastro, se multiplicaram as publicações, o que não foi um privilégio da nossa imprensa, mas macaqueação das Hola e Dayli Mirror da vida. Se vende? Claro que vende. Não importa nem mesmo a qualidade gráfica - temos revistinha de notícias de tevê a preços módicos em que as fotos são borradas e os textos ilegíveis.
Mas há quem tenha conseguido prestígio pelo profissionalismo com que aborda temas banais e não me surpreendeu ouvir de um ator gaúcho respeitado a afirmação de que ficava muito feliz por ser entrevistado pela Caras por saber da repercussão de suas declarações num universo de leitores qualificados.
Alguém vai dizer aí que a questão é realmente a dose certa da mistura de temas mundanos com boa edição e até vou concordar. Quem garante que ao menos não dá uma folheada em uma publicação do tipo enquanto espera no salão do cabeleireiro ou na espera do consultório que atire a primeira pedra. Eu não ito que faço e, eventualmente, tenho boas surpresas no que leio.
Determinada época, colaborei com as revistas Cláudia e Marie Claire, que entram naquele nicho chamado "feminino" e as exigências dos editores eram grandes. Rara foi a ocasião em que aprovaram a matéria sem um reparo, fosse na coleta de dados fosse no texto final e acho que o caminho é esse mesmo - embora nem sempre o que ficava fosse melhor do que havia sido mandado para a redação.
Agora, com o jornalismo eletrônico, vejo que se agravam não só as questões de pauta mas também as de produto final. A rede está disseminando não só lixo mas uma quantidade apavorante de erros de português e, pior, de informação. Onde estará o furo? Sabemos que o mundo acadêmico, que joga no mercado estagiários e profissionais, não prima pelo zero de tolerância em relação à falta de qualidade. Aperfeiçoou-se o corpo docente, com doutorados e pós, mas o sistema continua o mesmo de quando me formei na Fabico, nos idos dos 70 e continua valendo a máxima de que jornalismo se aprende fazendo, em redações e assessorias, na loucura do dia-a-dia.
Talvez por isso o noticiário conte nos dedos quantas vezes nos últimos meses Britney Spears saiu à rua sem calcinha. Ou não temos mesmo o que dizer e precisamos abastecer o distinto público leitor com este amontoado de bobagens. Afinal, mais um ano se ou, os aborrecimentos devem se repetir no seguinte e alguém tem de atirar bolo para quem custa a ganhar para o pão nosso de cada dia. Perdoem, portanto, o mau humor com a falta da calcinha da Britney. E tratem de me arrumar um bom assunto, bem tolo, para eu me distrair e deixar de lado esta rabugice que não vai mudar coisa nenhuma.