Agendando…
Os insistentes pedidos de meus catorze leitores lograram êxito: retomo a coluna, prometendo ao Vieira, mais disciplina. Nestes três meses, envolvi-me com projetos que …
Os insistentes pedidos de meus catorze leitores lograram êxito: retomo a coluna, prometendo ao Vieira, mais disciplina.
Nestes três meses, envolvi-me com projetos que me tiraram de Porto Alegre, orientações de alunos e preparação de novos cursos para a Coletivaeac.
Fascinado que sou por rádio, mais que nunca, usei minhas manhãs para zapear no dial. Sempre nas rádios de notícia. A portabilidade da informação que tem o rádio, mais a tecnologia de celulares com FM, tornou este veículo um companheiro inestimável para quem quer manter-se informado, em deslocamento.
Escuto Band, Bandnews, Gaúcha, Guaíba e Pampa. Fidelidade, zero.
Tem-me chamado à atenção a Rádio Gaúcha, das 8 às 11 horas. É uma aula de agenda-setting.
No final dos anos 60 e início dos 70, pesquisadores americanos fizeram pesquisas em duas cidades do interior dos Estados Unidos. Queriam identificar quem agendava quem. Se a mídia agenda o público ou o público agenda a mídia. Para isto, nas eleições presidenciais de 1968 e 1972 entrevistaram, por telefone, pessoas que não haviam definido seu voto. Estavam elaborando os estudos que redundaram na hipótese comunicacional da agenda-setting.
A constatação da pesquisa: a mídia agenda o público que, por sua vez, também agenda a mídia.
A hipótese trata de processos comunicacionais a médio e longo prazo, que implicam a preponderância de determinados temas nos corações e mentes do público.
Na prática, segundo Maxwell McCombs, que é o mais proeminente nome deste trabalho, a mídia tem poder para determinar sobre o que o público pensará.
O assassinato da menina Isabela e o episódio dos travestis do Ronaldo são exemplos de fenômenos agendados recentemente. Há mais tempo, as fotos da companheira sem roupas íntimas de um certo presidente da República, exerceram papel semelhante.
Na política, a todo instante, observamos situações semelhantes. Sugiro, para exemplificar, que Você sintonize algumas emissoras, no dia seguinte ao de um depoimento explosivo na I do Detran, e cronometre o tempo destinado ao tema em cada rádio de notícias de Porto Alegre. Você ficará surpreso com as diferenças de abordagens e tempos destinados ao tema nos vários veículos.
O agendamento de um tema pode definir o resultado de eleições, de campanhas publicitárias ou de outros fenômenos comunicacionais.
Aí entra a lição de agendamento que a Rádio Gaúcha nos propicia. Muito pior que a parcialidade assumida, exemplos de Rogério Mendelski e Beatriz Fagundes, é a falsa neutralidade.
Faz muito tempo que o programa Polêmica, na busca de imparcialidade, em que apesar da clara orientação política do apresentador, vem abordando a política por um viés partidário. Só para exemplificar, há cerca de dois anos, o ouvinte foi convidado a votar em quem seria o melhor presidente: Lula, Kirchner ou Chávez. Quase liguei para votar no Lula?
Mais recentemente, de forma mais contida, a postura está vazando para o programa anterior. É comovente observar o afeto dos apresentadores do programa pela candidata petista à presidência. Interessa muito mais apresentá-la como Mãe do PAC do que Mãe do dossiê, estilo Gestapo, contra FHC. A sensação ao encerrar uma entrevista com esta turma de Brasília é a de um fanático torcedor entrevistando seu ídolo.
Se é uma lástima do ponto de vista da democracia, não deixa de ser um ótimo laboratório acadêmico.