Adeus Tia Chica, como diz o outro
O outro é um personagem misterioso e onipresente no inconsciente coletivo do brasileiro; ele é quase um cúmplice das pessoas. O outro está sempre pronto …
O outro é um personagem misterioso e onipresente no inconsciente coletivo do brasileiro; ele é quase um cúmplice das pessoas.
O outro está sempre pronto a ser responsabilizado por qualquer opinião, frase ou mesmo palavras soltas, quando quem disse não quer assumir descaradamente o que está dizendo. Por exemplo, a mulher que sugere sua disponibilidade sexual e afetiva, mas não quer fazê-lo de modo direto, o que ela diz? "Estou leve, livre e solta, como diz o outro". O outro a a ser co-responsável por esta declaração, não foi ela quem disse. O lobista mal intencionado e covarde, o que ele diz? "Quero levar a minha beira neste negócio, como diz o outro". Com esta simples transferência de responsabilidade, ele desagrava-se: foi o outro quem disse. O outro é o bode expiatório caso dê alguma zebra. No receio de a vaca ir para o brejo, apela-se para o outro. Quem não tem cão caça com gato, como diz o outro.
Outra personagem misteriosa das lendas urbanas brasileiras é a Tia Chica. Sempre que algo dá errado, ela parte, se manda. Não quer participar daquela comédia de erros. Faz as malas e vai embora. As pessoas sensatas que predisseram o malfadado erro, imediatamente antecipam o adeus para a Tia Chica: "? Eu avisei, não quis me ouvir, agora, adeus, Tia Chica". E não por coincidência, quando Tia Chica parte, simultaneamente a Inez morre e o leite derrama. Portanto, em casos mais greves utiliza-se todas as expressões: "Não quis me ouvir, agora, adeus, Tia Chica, Inez é morta, e não adianta chorar sobre o leite derramado".
Imagino a Tia Chica fazendo as malas e o corpo de Inez estirado no chão, em meio a uma poça de leite derramado. Um gato se aproxima para beber o leite e alguém atira um pau no gato, mas o gato não morre. Um pouco antes de bater a porta, Tia Chica ira-se do berro que o gato deu. Na cantiga popular ela é descrita como Dona Chica, mas sei de fonte confiável tratar-se da mesma pessoa, não duvido.
Contudo, as metáforas não são menos interessantes quando os brasileiros falam dos seus problemas. Para omitir a gravidade deles buscam inspiração em produtos horti-fruti-granjeiros. O pepino, óbviamente pela evidente alusão a sua forma fálica e o risco e o temor que isto representa, é amplamente utilizado. Por exemplo, meu prazo para escrever esta crônica começou a se esgotar, eu estava com um baita pepino. Depois me dei conta da diferença entre pepino e abacaxi. Escrever nunca é um abacaxi. Claro, há sempre o risco de, na falta de assunto, falar-se