A última romântica
Faltava abandonar a velha escola, tomar o mundo feito Coca-Cola, fazer da minha vida sempre o meu eio público, e ao mesmo tempo fazer …
Faltava abandonar a velha escola, tomar o mundo feito Coca-Cola, fazer da minha vida sempre o meu eio público, e ao mesmo tempo fazer dela, o meu caminho?
A música, cantada pelo Lulu Santos, chamada "O último romântico", descrevia exatamente o meu momento até uns 15 dias atrás. Na ponta do lápis, uma parte importante da minha mente ainda permanecia plantada em coisas do século ado. Já sei que a gente não namora, fica. Que não se sai, vaza. Que não se comparece nos compromissos do colégio da filha, isso é pagar mico. Mas, a minha última resistência para entrar, definitivamente, no século XXI, que era voltar aos bancos escolares, ainda não havia sido vencida.
Depois de anos e anos distante das salas de aula e com uma mochila cheia de desculpas que justificavam o meu afastamento, retornei para um curso específico dirigido para jornalistas oferecido pela ESPM. Nada que prejudique a minha rotina diária de jornalista, meus frees, a minha coluna aqui no site e nem mesmo a minha função como mãe/amiga. Pois tudo foi feito para se encaixar no cotidiano enlouquecido do jornalista: conteúdo enxuto, horário na medida, colegas selecionados e atentos e professores compreensivos. O meu reencontro com a realidade escolar, no entanto, não teve uma preparação prévia.
Tempos difíceis aqueles do quadro-negro, do lápis de cera, dos temas mimeografados e dos exames orais, que também recebiam o nome de sabatinas (não por serem realizados no sábado, ok?). No recreio, a gente aproveitava o pouco tempo de intervalo para entregar para as amigas um questionário que deveria ser respondido com rapidez e reado para outra, com umas perguntas tão idiotas, mas que tinham imenso valor; ou então, comentar a última música do Roberto Carlos. Da merendeira (nessa, me puxei, eu confesso), saía um lanchinho básico preparado pelas amadas mães, totalmente equilibrado, sem nada de conservante, ou qualquer outro ante ou gênico que se possa imaginar.
Na minha aula de "Desvendando o Marketing", as surpresas são inevitáveis. Nada é como antigamente. Sem nenhum saudosismo aí nessa constatação. É um outro saber. Tempos modernos. A matéria não precisa ser copiada. É tudo entregue no início da aula. Os professores se apresentam com todo o seu currículo e ninguém precisa perguntar nada, até mesmo o email eles fornecem. No lugar do quadro-negro, um imenso espaço branco com um quadrado que se movimenta e aceita data-show, slides e tudo em tecnologia. Bem, nem tudo pode ser assim tão revolucionário. A chamada ainda existe. Com alguma adaptação. Como o professor se divide em cinco mil e não consegue conhecer cada aluno, ele tem a foto de cada um na sua lista (o carômetro).
O choque com a realidade foi inevitável. Em que mundo eu me escondi nos últimos (hehehe?) 15 anos (só prá deixar barato) que não testemunhei tanta tecnologia? Sei lá. Mas, as primeiras duas aulas foram suficientes para me mostrar que é sempre bom estar receptiva às renovações, que nunca se sabe tudo e que sempre é tempo de recomeçar. Na medida do sono que sempre me assalta no início da manhã, tenho tentado ser uma aluna aplicada, até um pouco CDF: sento bem na frente e não converso com as colegas. Às vezes, o professor faz uma pergunta tão óbvia que temo em responder, e sempre a resposta é o que pensava. Enfim, algo similar aos meus tempos de colégio de freira.
Na hora do recreio, é claro que nenhum de nós do curso da SPM puxa o lanche básico de sua merendeira. Como jornalistas que se prezem com os nervos manchados de fumo e café, todos correm para a cafeteria, onde entre rápidos goles de café comentam as pautas, os últimos fatos da política e olham seus emails na internet do local. Nada que lembre os recreios de anos ados. Agora, sei que sou uma mãe moderna. Não tem mais volta. Compreendo porquê a Gabriela não usa muito as folhas do caderno, tem muitos temas no computador, quer sempre conversar com as amigas por email e sempre sabe toda a matéria. Não falta mais eu acordar, já sou gente grande e posso chorar?