A terapia do riso
No filme "Banquete do Amor", que assisti no final de semana, o ator Morgan Freeman, introduz a análise sobre os acertos e desacertos sentimentais …
No filme "Banquete do Amor", que assisti no final de semana, o ator Morgan Freeman, introduz a análise sobre os acertos e desacertos sentimentais de uma comunidade do Oregon, Estados Unidos, citando uma lenda para explicar o nascimento do amor que ele atribui à mitologia da Grécia antiga. "Há uma história sobre deuses gregos de que eles estavam muito entendiados e inventaram o ser humano. Mas continuavam entediados e então inventaram o amor para combater o tédio. Só que decidiram experimentar o amor. E, finalmente, inventaram o riso para conseguir á-lo", explica Freeman, à medida que o enredo começa.
Desde então, a mensagem inicial do filme me persegue. Na volta do cinema. No lotação. No supermercado. Na farmácia. No médico. No colégio da minha filha. Pior do que chiclete quando gruda na roupa. Não sabia explicar muito bem o que me perturbava ou não naquela mensagem. Uma forma diferente do surgimento da espécie humana? Podia ser! Ou um alerta da ganância do ser humano ao experimentar o amor, o que é quase semelhante ao que diz a Bíblia sobre o momento em que a maçã foi comida e as promessas quebradas? Também! Mas, como no jogo do Lego (ah, ta que não conhece!), uma peça não se encaixava.
Até que por problemas alheios a minha vontade, a rede de internet do colégio da minha filha Gabriela Martins Trezzi saiu totalmente do ar, na terça-feira à tarde. E, três integrantes do trabalho em grupo da Gabriela, que iriam reunir-se no colégio, já estavam na área. Oh, my god! Antes que quatro adolescentes ficassem levemente histéricas, abdiquei dos meus afazeres frente ao George Clooney, nosso computador, e disse que Gabriela e suas três amigas poderiam usá-lo. Trancada no quarto, acalmando o cachorro psicótico Dalai que ameaçava comer cartolinas, tênis e tudo mais, ouvia elevações de vozes e gargalhadas intercaladas.
Resolvi ver in loco (afinal, apenas um corredor me separava da cena). E imaginei cadeiras quebradas, caras amarradas, papéis rasgados, dissolução do grupo e nem queria pensar. Nada! Tudo corria na mais perfeita ordem, segundo me asseguraram as quatro. Gabriela, um pouco impositiva, queria as letras do cartaz de uma cor, mas M (não vou citar o nome das meninas), bem determinada, entendeu que cor de letra e da cartolina não combinava. Só que todas as propostas tinham argumentos. E M2 e P (como vou chamar as outras meninas), da turma do "Deixa Disso", tentavam o denominador comum. Sempre com sorrisos e risadas. Todas.
E desvendei o mistério da minha ligação com a mensagem do filme. O riso a que Freeman se referiu não foi inventado para amparar o amor, a amizade, a paixão e outros sentimentos. O riso sobrevive sozinho, não precisa de bengalas, não exige doses homeopáticas, nem superdosagens, nem receituário azul. E é capaz de encurtar caminhos, recuperar amores, sufocar ódios, alimentar os dias e as noites monótonas ou intensas. O riso foi inventado antes de tudo. Atropelou o tédio, o chefe azedo, o amor que não chegou e o que partiu, o ódio que ficou, a mágoa que se alojara. O riso não salva uma relação destruída. Mas é capaz de sair mais cedo do analista do que os envolvidos.
Algumas coisas, infelizmente, a gente aprende depois que ou dos "enta", normalmente com os filhos. Mas sempre é tempo. A Gabriela me ensinou a sorrir desde que nasceu. Durante um tempo esqueci. Redescobri. Os melhores dias são aqueles que classificamos de inúteis (sem cinema, sem shopping, sem super, sem comida fora, sem parque, sem política). Não fazemos absolutamente nada, e ficamos as duas rindo e brincando com o cachorro. Rindo muito!