A bola no centro do olhar
Bom exercício, o de olhar televisão tirando o som do aparelho. Em especial nos jogos de futebol. Mais especial, ainda, nos jogos de Copa …
Bom exercício, o de olhar televisão tirando o som do aparelho. Em especial nos jogos de futebol. Mais especial, ainda, nos jogos de Copa do Mundo, estes, de quase fim de festa. Ainda mais agora, em que a câmera aparece muito mais preocupada com o particular do que com o geral. E chega a ser engraçado o fato de que ganhamos mais espaço na tela para ver mais, para ver tudo aquilo que o tubo arredondado "antigo" escondia nas laterais, e o que mais nos prende a atenção é justamente aquele close que deixa a bola como rainha em cima do gramado.
De repente, tudo some. É apenas uma bola branca, com rabiscos pretos, absolutamente parada num canto, esperando uma decisão.
Jogadores, torcida, propagandas, céu, estádio: tudo desaparece. E começa a dar uma angústia em quem olha aquele objeto ali, quieto, esperando um chute definitivo. Ou não.
Quanto mais demora aquela imagem no vídeo, mais aquele que vê tem tempo para ir pensando, se angustiando, imaginando, criando antes o que vai acontecer.
Exagerando, pode-se dizer que o momento em que a bola está parada, à espera, importa mais do que o que virá a seguir. A expectativa, então é tudo.
Para quem está em campo, na arquibancada. Para quem está atrás de microfones e câmeras. Para quem está alguns quilos mais magro de tanto correr no gramado. E, principalmente, para quem está diante de uma tela, seja ela antiga, pequena, numa sala modesta. Seja num home theater com mão de decorador. Seja num site. A imagem nos captura. E nos mantém cativos até que um pé poderoso joga para longe aquela peça incômoda e arrogante em seu poder de nos manipular. Aí, então, podemos prestar atenção a todo o resto que está enquadrado nesta janela misteriosa que traz, em tempo real, toda a dimensão humana, em seus diferentes contornos, de poder e de falência.
E temos mais uns dias pela frente, ainda, para espiar esta paisagem.