Optar consciente 2r5k72

A escolha de uma simples foto para uma notinha em um jornal equivale a muitos votos marcados na urna. A favor ou contra. A … 602c42

16/10/2008 00:00

A escolha de uma simples foto para uma notinha em um jornal equivale a muitos votos marcados na urna. A favor ou contra. A foice e o martelo para um candidato, o sorriso e o abraço para o outro. São exemplos atuais de uma prática que vem de longe. A comunidade intelectual não desconhece o truque, mas continua à mercê das teses comunicacionais e dos métodos sociológicos de desumanização. Reengenharia, por exemplo, sabe-se hoje, significava desemprego, com a revoada do aralho. Otimização e terceirização poderiam ser traduzidas por mais trabalho em menos tempo, menores custos previdenciários, maior produção e, conseqüentemente, maior lucro. 15i3j

A linguagem disseca o fato. Tira dele, ou coloca, conforme a intenção, o sangue e o terror. Confere a um ato características científicas. Troca termos de significado humanitário por definições assépticas. Escolher as palavras não é um ato particular. A comunicação opta e faz optar.

Há mais de meio século, a informação já era utilizada para maquiar a maior mortandade promovida pelo Estado: o Holocausto, fantasma que até hoje assombra, de perto, a comunidade européia. Ainda não foi exorcizado suficientemente aquele ato de terrorismo coletivo contra a humanidade e é preciso que se entenda como esse ato se processou, como foram planejadamente desprovidas de sentimento as palavras e as ordens dirigidas ao povo alemão, para que houvesse a mórbida participação massiva que transformou cidadãos comuns em auxiliares de assassinatos em massa.

A Questão Humana é um filme francês, com direção de Nicolas Klotz e roteiro de Elizabeth Perceval, baseado em livro de mesmo nome de Francois Emmanuel. Um psicólogo que trabalha em Paris, em uma petroquímica de origem alemã, precisa lidar com demissões e recebe a incumbência de investigar o próprio vice-presidente, que a a apresentar uma mudança de comportamento suspeita e invulgar. O enredo leva o personagem Simon (Mathias Amalric) a conhecer e perceber a aplicação da linguagem técnica na própria questão humana, tratada no filme como um simples "problema". A relação dos fatos atuais com a história da eliminação dos judeus é lenta e, assim como Simon, vamos mudando a nossa percepção de que o sistema oferece válvulas de escape para que convivamos em uma sociedade seletiva e excludente. As raves, por exemplo, são apresentadas como o atual ópio do povo, e funcionam como reguladoras da violência na sociedade, que é obrigada a conviver ao mesmo tempo com a segregação racial e a disputa selvagem por melhores postos de trabalho. Nessa situação, mesmo um psicólogo, acostumado a tratar de temas delicados, sob um ponto de vista humanitário, pode ser utilizado, sem que o perceba, para direcionar o homem a incumbências questionáveis.

O filme alerta para que a gente entenda e reconheça os instrumentos que nos levam a tomar algumas decisões. Nos propõe que ouçamos, sem o auxílio das imagens, o que significam de fato as mensagens transmitidas. Que possamos substituir termos tecnológicos por conceitos vivos.

Portanto, ao ler o jornal de cada dia, é preciso pensar melhor se tudo aquilo exposto não está cientificamente concatenado com uma idéia maior de controle sobre a sociedade e sua forma econômica de subsistência. É importante traduzir o que é dito, e perceber com a nossa máxima sensibilidade, o que nos leva a fazer certas escolhas. A marcar um ?confirma? ou ?corrige?.