Quando o bom senso vai pras cucuias
Por Iraguassu Farias, para o Coletiva.net

Com algumas décadas nas costas e, mesmo em tempo de comunicação digitalizada, breve e objetiva, a gente ainda acha que algumas coisas não se perderam ao longo do tempo. Já falei aqui sobre a mania das pessoas não responderem mensagens de whats e email, como respondíamos cartas antigamente. Mas - ito -, é coisa de velho....hehehehehe.
Falando em velho, uma coisa que ainda me incomoda é a falta do velho bom senso. Aquele que nossa inteligência manda dizer: "Tá bem, é a regra. Mas o bom senso manda que...."
E como sempre faço quando uso este espaço destinado aos leitores, quero deixar muito claro que é uma posição pessoal e que nestas linhas não represento a opinião do portal Coletiva.net, tampouco dos nossos jornalistas.
Detalhe 1: o Coletiva.net foi novamente convidado a ser Media Partner do South Summit de 2025. Como em edições anteriores, produziremos perto de 80 matérias de dentro da feira e, não tenho certeza, deveremos ser o veículo que mais conteúdos gerará do evento. Temos oito jornalistas no festival e mais a "meninada" da Famecos, que sempre nos acompanha na cobertura (volta à meninada depois...).
Detalhe 2: estou Imprensa. Não sou jornalista, e de comum acordo com a publisher, não pedi credencial de Press, e não iria fazer as vezes de tal. Mas recebi um de Media. E acho que as duas expressões andam meio juntas, sabe?
Detalhe 3: no primeiro dia do evento, fui visitar e tive o à sala de Imprensa. Expliquei que fazia parte do Coletiva.net, que inclusive figurava fulgurante nas logomarcas dos parceiros na parede. Obviamente isto nos orgulha. Conversei com nossos colaboradores, tomei um cafezinho e fui à luta para as tais conexões.
Hoje, último dia, fui levar minha filha (jornalista e minha sócia). Não ficaria. Já tinha visto o que queria ver. Deixei-a na entrada e fui estacionar o carro nas proximidades (carro o dia inteiro no estacionamento é caro e estava chovendo). ei o South Summit, fui levar a ela a chave do carro. Me barraram na entrada. A ordem nova era "só crachá Press". Falei que iria apenas falar com minha filha e sairia rápido. A contragosto, me deixaram, não sem ter um jovem de camisa laranja ao meu lado me seguindo literalmente até o local em que nosso pessoal estava. Que sensação estranha aquela "escolta".
Conversei na saída rapidamente com o presidente da Arfoc e fui embora. Ao fazê-lo, já perto do pavilhão de expositores e que dá o à saída, me dei conta de que esqueci de deixar a tal chave com minha filha e de dizer-lhe onde estava estacionado o carro. Ao retornar, novamente barrado. Um dos quatro ou cinco jovens do "cara-crachá" ou o scanner e bingo! Não pode entrar. Expliquei que era rápido, que iria apenas largar uma chave. Não houve jeito. Não estava conseguindo convencer a jovem. Explicaram que era a nova ordem. Disse que entendia, mas que achava que não haveria mal algum entrar apenas por um minuto. Não amenizaram. Sanguíneo e sem saco, disse que ia entrar. E entrei. Claro que alguém de camiseta laranja me seguiu.
Entreguei a chave e fui me retirar. De repente, surge alguém não tão jovem, sem a camiseta laranja dos imberbes da porta de entrada, e me inquiriu porque eu havia entrado contrariando a regra. Expliquei meu ponto de vista e disse, em alto e bom tom, que entendia as razões pelas quais haviam estabelecido esta regra, mas que achava que o bom senso deveria imperar. Leu meu crachá e comentou: "A gente até gosta do Coletiva (sic), mas exatamente por isto eu deveria entender que o meu pessoal, inclusive, deveria ter tranquilidade pra trabalhar". Eu falei: "Estou entendendo o que tu estás falando, mas a questão aqui é se tu estás entendendo o que eu estou falando. Sou da imprensa, sou Media Partner e mereceria mais consideração".
Fui perguntado se a "meninada" dele tinha sido mal educada, disse que em absoluto tinham sido. Mas insistia em saber porque "invadi a sala". Falei, já muito incomodado, que a razão que me fez entrar era irrelevante, que não justificava aquele constrangimento (a esta altura os olhares eram para esta cena), e que, se fosse preciso, eu entraria novamente. Claro que o sujeito pirou, ainda que sem ser mal educado. Não esperava aquela resposta. Imagina quebrar a regra? Ela era maior e se impunha frente a qualquer motivo irrelevante que aparecesse. Do tipo "não pode e ponto final".
Arrematei e disse que achava que ele deveria orientar a "meninada" dele a usar o bom senso. Pouco me importa se eram voluntários, contratados ou amigos do rei. Um deles, à entrada, teve uma recaída dizendo, com a singeleza de seus poucos anos, o famoso "eu concordo com o senhor, mas se eu deixar, vão vir pra cima de mim". Deprimente.
Não se sei o meu interlocutor intransigente sem ser agressivo é gaucho. Fosse, saberia que o termo "meninada" - que aqui uso propositadamente entre aspas, chega a ser carinhoso por estas bandas quando queremos nos referir a jovens. Da mesma forma que paulista usa "moleque", que aqui nos Pampas as vezes torna-se pejorativo e agressivo. E digo isto porque o sujeito pareceu ofendidíssimo com o termo, como se eu tivesse depreciando a condição dos jovens. Na verdade, da...."meninada".
O responsável ainda foi até a porta de saída querendo conversa. Quando achei que já havia esgotado meu estoque de argumentos, dei de costas, deixei-o falando sozinho e saí (não gosto muito deste meu lado, digamos, grosso. Mas tenho facilidade para atrair um treta, que já estou calejado).
Obviamente que isto é apenas uma reflexão pra gente se perguntar sobre o "onde foi parar o bom senso?". Muitas vezes, pressionado pela situação, entrei em hospitais fora do horário de visitas. Já furei situações em que não era convidado. Já entrei nos EUA sem visto e fiquei preso. Já ei por muitas e não acho que a regra não possa, vez ou outra, ser quebrada em nome do bom senso.
Obviamente que vou declinar o nome do sujeito que "até gostava do Coletiva", assim como da empresa para qual presta serviços. Isto não é uma denúncia, nem mesmo um defenestrar de reputações. Apenas um caso para reflexão. E porque constrangimentos como este doem um pouco mais em quem já tem seis décadas de vida. Se já não havia motivos para que eu ficasse muito tempo ali, agora, havia outros mais pra sair correndo.
Penso, salvo melhor juízo, que a Comunicação falha na comunicação, especialmente quando também ela deixa de usar o bom e velho bom senso. Ah...durante a breve estada, encontrei duas pessoas conhecidas: 100% de fraude. Usavam crachás que não eram os seus. Um, inclusive, era mulher com crachá de homem. Mas certamente o QRCode deles lhes daria o à sala de Imprensa, caso o crachá fosse Press. E eu, malditamente, não tinha um crachá de Press para chamar de meu. Quem manda não ser jornalista.